10 setembro 2010

Simplicidade, lógica, razão e o comportamento humano


O mundo que nos rodeia é cada vez mais complexo. Dos telemóveis aos automóveis, dos despertadores aos computadores, dos estacionamentos aos aquecimentos, tudo nos impõe mais conceitos, mais técnicas, mais botões. O lamento pela perda da simplicidade de outrora é constante. Então, num mundo dominado por máquinas de lavar cheias de botões, luzinhas e manípulos, um conhecido fabricante de máquinas de lavar roupa desenvolve um projeto revolucionário: uma máquina que pesa a roupa, da qual determina o grau de sujidade, através dos quais doseia automaticamente a quantidade de detergente e escolhe o mais eficiente programa de lavagem.

Cúmulo da simplificação, a máquina é apresentada pelo Departamento de Engenharia com apenas dois controlos: um botão de ligar/desligar, e a escolha entre "roupa de cor ou muito suja" e "roupa de limpeza fácil"; o resto do programa é determinado pelo próprio aparelho, que dispõe de um automatismo tal que, com toda a simplicidade, parcimónia e racionalidade, reduz ao mínimo os gastos de água, detergente, tempo e energia. Contudo, esta máquina acaba por ser apresentada ao público com uma profusa quantidade de controlos adicionais, impostos pelo resultado de estudos feitos pelo Departamento de Marketing!

Pois é. Todo o racionalismo na conceção, toda a simplificação do uso, toda a sofisticação do funcionamento, esbarraram em dois factores de peso. Por um lado, a perceção por parte do consumidor, quando compara as máquinas em exposição à procura da que vai adquirir, de que quanto mais funcionalidades a máquina tiver, melhor é - e que as funcionalidades têm, forçosamente, que se traduzir em mais comandos e botões. Por outro lado, um sentimento primário absolutamente contrário aos clamores por mecanismos mais simples, e que pode ser traduzido por algo como "mas queres uma máquina que mande em ti, ou vais tu mandar na máquina?" e que deita por terra os automatismos mais argutamente desenvolvidos.

A razão é um valor que a Maçonaria muito preza. Contudo, a mente humana não paira no éter: reside no cérebro, que por sua vez está agarrado ao resto desta coisa a que chamamos corpo. E mesmo a mente humana não é, como podemos ver, um bastião de razão pura. Por isso a Maçonaria insiste na tolerância, no equilíbrio e na diversificação dos saberes enquanto medidas conducentes à harmonia entre corpo e espírito, à aceitação das diferenças, e à interiorização de que, no fundo, somos frágeis, falíveis e imperfeitos - primeiro passo para pretendermos tornar-nos melhores.

Paulo M.

Para quem tenha curiosidade quanto à história rerferida:
http://www.jnd.org/dn.mss/simplicity_is_highly.html
http://www.joelonsoftware.com/items/2006/12/09.html

3 comentários:

Nuno Raimundo disse...

bOAS...

Quantas vezes não adquirimos nós, algum equipamento que tem funcionalidades em demasia?
Funcionalidades essas que nunca utilizaremos ou que o seu uso seja tão diminuto, que não justificaria o acréscimo de preço que o equipamento tem relação ao modelo que sucede?

Não bastas vezes o fazemos.
E apenas sempre pela mesma razão, e os Tugas são bons nissos. Há que ter algo que seja melhor que o que tem o nosso vizinho.
Se ele tem "X", então há que adquirir "Y", se ele faz férias em "N", há que termos férias em "Z"...

E é com atitudes destas, que eu pessoalmente considero de estúpidas e de ignorantes, que levam muitas vezes a crises familiares e financeiras, devido aos custos acarretados.
Mas isso é de somenos, para a éstória que o Paulo retratou e muito bem.

Muitas das vezes pensamos que o mais complexo é o mais completo, o que deriva em erro quase sempre, porque a complexidade leva à simplicidade ou seja, por demais funções/ "controls" que encontremos, apenas utilizaremos sempre os mesmos...
E gostamos( não digo adoramos, para não "pesar" na afirmação) de mandar, e não de ser mandados.
O problema é que para mandar/dirigir é necessário o saber fazer, não basta termos um posto superior na hierárquia, se não o soubermos fazer.
E em Maçonaria isso representa a meu entender ( que a vejo de fora), uma das forças que uma R.L. pode ter, o carácter e a "força" do seu Venerável Mestre, são disso exemplo, se souber "dirigir" os seus "homens", a R.L. não perderá vigor e não sairá dalinha/plano traçado pelos seus Obreiros.

(fugi um pouco ao tema principal do post " a Razão", porque preferi comentar na "diagonal")
:)


abr...prof...

Candido disse...

A perfeição é UTOPIA meu caro Paulo.
Abraços

Jocelino Neto disse...

Paulo: Mais um ótimo texto!

Nuno: Mais um ótimo comentário!

Cá trago a vocês um texto com um tom complementar.

http://www.sabbatini.com/renato
/correio/ciencia/cp011109.html