25 setembro 2013

Força e Razão



A Força, incontrolada ou mal controlada, não é apenas desperdiçada no vazio, tal como a pólvora queimada a céu aberto e vapor não confinado pela ciência; mas, golpeando no escuro e seus golpes atingindo apenas o ar, ricocheteia e se auto-atinge. É destruição e ruína. É o vulcão, o terramoto, o ciclone, não crescimento ou progresso. (...)
Precisa ser regulada pelo Intelecto. O Intelecto é para as pessoas e para a Força das pessoas o que a delicada agulha da bússola é para o navio – sua alma, sempre orientando a enorme massa de madeira e ferro,e sempre apontando para o norte.

(Albert Pike, Morals and Dogma)


A Força é uma das qualidades essenciais dos atos e obras que os maçons devem empreender (as outras são Sabedoria e Beleza).

Para os maçons, o conceito de Força abrange a Força de Caráter, a Força de Vontade de quem realiza, mas também a Eficácia e a Durabilidade do que se realiza.

O excerto acima transcrito alerta-nos para o modo como se deve utilizar a Força: não irracionalmente, não descontroladamente, não usando a Força pela Força, mas antes mediante a intermediação e o controlo do Intelecto, da Razão. A Força de Caráter sem o domínio da Razão degrada-se na Teimosia. A Força de Vontade sem o equilíbrio do Intelecto reduz-se à Obstinação. A Eficácia da obra realizada não pode ser obtida a todo o custo, sacrificando indiscriminadamente ou prejudicando desnecessariamente outros valores, bens ou pessoas. A sua Durabilidade deve corresponder ao destino e utilização da obra: é tão insano misturar demasiada areia no cimento, enfraquecendo o betão que deve sustentar o edifício como misturar cimento na areia com que se faz um estival castelo na praia, destinado a desaparecer na subida da maré seguinte.

No processo evolutivo da construção de si mesmo que o maçom empreende desde o dia da sua Iniciação até àquele em que pousa as suas ferramentas e passa ao Oriente Eterno, deve inevitavelmente aperceber-se que tem de dar atenção ao seu caráter e à sua vontade, reforçando a sua força, mas também ter presente a simultânea necessidade de dominar sempre a força que cultiva. Um homem de bem necessita de caráter e vontade fortes, mas dominados pela razão. Só assim é verdadeiramente um homem de bem e não um mero arrogante obstinado... 

O maçom deve aprender que, para fazer algo que valha a pena tem, sem dúvida, que ser capaz, que ser persistente, que ser eficaz, mas também que ser equilibrado, sob pena de se enredar eternamente na construção de obra sempre inacabada - desnecessariamente - ou de inútil fortaleza no meio de estéril deserto. 

Aprimorar a sua força de caráter, a sua força de vontade, deve ser incessante objetivo  do maçom, mas dominar aquele e esta através da sua razão não é desiderato menos necessário. Afinal de contas, o maçom não se deve limitar a desbastar a sua Pedra Bruta. Deve também dar-lhe forma e brilho para dela fazer uma devidamente aparelhada Pedra Cúbica...

A Força sem Razão é mera brutalidade, primarismo indigno do Homem. A Força pela Força não vale nada de jeito. Um dos trabalhos do maçom consiste, assim, precisamente em garantir que os seus atos beneficiam sempre da Força da Razão, não da razão da força!

Rui Bandeira

18 setembro 2013

Maçonaria e Democracia


Em 1700, era rei de Portugal D. Pedro II, terceiro filho de D. João IV, que depusera seu irmão, D. Afonso VI. Por sua morte, sucedeu-lhe no trono D. João V. Todos foram reis absolutos. Com exceção de Afonso VI, deposto por um golpe de Estado dirigido por seu irmão, todos exerceram o Poder, após a sua ascensão ao mesmo, de forma vitalícia.

Carlos II era rei de Espanha, Nápoles e Sicília à data da sua morte, em 1 de novembro de 1700. Morreu sem filhos e o seu decesso originou a Guerra da Sucessão espanhola entre 1700 e 1713, no termo da qual se afirmou como rei de Espanha aquele que Carlos II designara no seu testamento para lhe suceder no trono (!): Filipe V, Filipe de Anjou, neto de Luis XIV de França. Ambos foram reis absolutos - e vitalícios.

Luis XIV de França, o Rei-Sol, reinou neste país até à sua morte, em 1715, sucedendo~lhe Luis XV. Ambos foram reis absolutos - e vitalícios.

No norte da Europa, travava-se por essa altura a Grande Guerra do Norte, opondo o Império Sueco, cujo trono era ocupado por Carlos XII, ao Império Russo de Pedro, o Grande, ao reino da Dinamarca e Noruega, de Frederico IV, e ao reino da Saxónia-Polónia, de Augusto II. Todos foram reis absolutos - e vitalícios.

Em Inglaterra, na sequência da Revolução Gloriosa e da tomada do poder a Jaime II Stuart, reinava Guilherme III de Orange. Por sua morte, sucede-lhe, entre 1702 e 1714, a rainha Ana, que, em 1707, logrou a união dos reinos da Inglaterra e Escócia que perdura até hoje, sob a designação de Reino Unido. Em 1714 sucedeu-lhe Jorge I. No alvor do século XVIII, só estes monarcas, da dinastia de Hanover, coexistiam com um Parlamento no exercício do Poder. Com exceção de Jaime II Stuart, apeado do Poder pela Revolução Gloriosa, todos, após terem ascendido ao Poder, o exerceram vitaliciamente. 

No início do século XVIII, apenas uma instituição na Europa se caraterizava por os seus diversos núcleos elegerem os respetivos líderes pelo voto, conferindo-lhes mandato por tempo limitado: a Maçonaria.

O exercício do Poder mediante eleição e por tempo limitado é, hoje em dia, uma regra consensual nas democracias modernas. Mesmo aquelas cujo regime é monárquico reservam aos seus monarcas poderes limitados, apenas de representação e de influência moderadora, atribuindo o exercício do Poder efetivo a líderes eleitos pelo voto popular, com mandatos de duração limitada. 

A teorização do exercício do Poder por um igual designado pelo voto e da delegação desse exercício por períodos limitados de tempo ocorreu nas Lojas maçónicas e foi delas que se expandiu para as diferentes sociedades, no seio delas foi ganhando raízes e veio a ganhar o consenso atual em todo o mundo democrático.

Ao teorizar e praticar um modelo de exercício do Poder que recusava o seu fundamento do Direito Divino e assentava na legitimidade conferida pelo grupo em relação ao qual esse Poder se exercia e ao assumir o princípio de que essa delegação de Poder era temporária e objeto de periódica renovação, a Maçonaria rompeu com uma tradição milenar que permitia que apenas alguns privilegiados pudessem aspirar ao exercício do Poder (normalmente por sucessão dinástica) e que conferia esse Poder de forma vitalícia, só excecionalmente, e por via da força, assim não sucedendo.

A teoria e prática maçónicas, ao transitarem do seu interior para as sociedades, foram consideradas pelos poderes vigentes no que hoje se convencionou chamar de Antigo Regime como revolucionárias - evidentemente perigosas para a sustentação do poder vigente. Esta a verdadeira origem das desconfianças (quando não claras e, mesmo, violentas proibições) tidas pelos diversos Poderes vigentes na velha Europa em relação à Maçonaria.

A evolução dos tempos e o sentido dos ventos da História fizeram com que hoje seja praticamente consensual o que, há apenas trezentos anos, era somente apanágio de uma pequena e então quase insignificante instituição. No entanto, se as sociedades adotaram os princípios de designação de titulares de cargos políticos que só a Maçonaria praticava há trezentos anos, se essa prática é hoje consensual, porque subsiste a desconfiança? O normal seria o reconhecimento do pioneirismo... 

Para além da persistência de um reflexo adquirido, a meu ver tal sucede pelo facto de alguns maçons terem sido agentes ativos das transformações das respetivas sociedades. À míngua da possibilidade de refutação da fundamentação doutrinária consistente das novas ideias que se expandiam, os Poderes em queda apontavam o dedo aos "revolucionários", aos "agentes da desordem" - e muitos desses, alguns com proeminência, foram efetivamente maçons. Convinha aos Antigos Regimes confundirem as ideias inovadoras com os seus agentes de difusão. Aquelas apenas são refutáveis com outras ideias suscetíveis de convencerem. Estes eram de carne e osso, com virtudes e defeitos, anseios justos e excessos, escolhas certas e erros. Aquelas eram dificilmente refutáveis por quem estava prestes a sair no mais próximo apeadeiro da História. Estes eram alvos visíveis e suscetíveis de serem abatidos.

Hoje, quando os fundamentos democráticos estão bem assentes nas sociedades, é tempo de distinguir entre as ideias e os seus agentes difusores. As ideias - felizmente! - venceram. Mas, ao contrário do que os Antigos Regimes propalavam, não venceram porque agitadores as impuseram ou por elas lutaram. Venceram porque as ideias, elas próprias, se impuseram por si. Porque eram justas. Porque eram corretas. Porque correspondiam aos anseios das populações.

Espanta-me como gente claramente inteligente e democrata ainda hoje se deixa influenciar pelos preconceitos propalados pelos Antigos Regimes!

Rui Bandeira

11 setembro 2013

A Ordem DeMolay


Bandeira DeMolay

A Ordem DeMolay é uma organização de princípios filosóficos, fraternais, iniciáticos e filantrópicos para jovens do sexo masculino com idade entre os 12 e os 21 anos. Não existe (ainda?) em Portugal, mas está já bem implantada no Brasil. Foi fundada nos Estados Unidos, em Kansas City, em 24 de março de 1919, pelo maçom Frank Sherman Land, então Diretor do Departamento de Serviço Social do Riro Escocês (Scottish Rite) naquela cidade. O primeiro Capítulo DeMolay iniciou-se com 33 jovens da referida cidade.

Em 1921, a Ordem DeMolay passou a ser diretamente patrocinada pela Maçonaria americana, nos Estados Unidos, sendo normalmente utilizadas as instalações maçónicas para a realização das reuniões e atividades dos Capítulos DeMolay. Rapidamente a pequena estrutura iniciada em 1919 se expandiu. Em poucos meses, o Capítulo inicial agrupava cerca de 2.000 membros. Em poucos anos, criaram-se novos Capítulos um pouco por todo o lado nos Estados Unidos. Internacionalmente, a Ordem DeMolay existe presentemente, além do país fundador, no Brasil, Argentina. Canadá, Bolívia, Colômbia, México, Aruba, Guam, Alemanha, Austrália, Filipinas, França, Itália, Japão, Panamá, Peru e Uruguai. Atualmente existem, neste conjunto de países, mais de 170.000 jovens ativos em mais de 15.000 Capítulos DeMolay (mais de 800 no Brasil). Desde a sua fundação, já passaram pela Ordem DeMolay mais de quatro milhões de jovens.

O nome da organização homenageia Jacques de Molay, 23.º e último Grão-Mestre da Ordem dos Templários, morto na fogueira em 18 de março de 1314, aoós o golpe de Filipe, o Belo, e do Papa Clemente V que aprisionou (quase) todos os cavaleiros templários e originou o fim desta lendária ordem de cavalaria.

Para ser admitido na Ordem DeMolay, o jovem compromete-se a ser melhor filho e homem, honrar os seus pais, amar e servir o Criador, o seu País e todos os homens de bem, proteger as escolas públicas, não difamar ninguém e a respeitar as opiniões dos outros. São baluartes da Ordem DeMolay a defesa da liberdade religiosa (representada pelo Livro Sagrado), da liberdade cívica (representada pela Bandeira Nacional) e da liberdade intelectual (representada pelos livros escolares).

Os princípios essenciais do comportamento do jovem DeMolay podem ser resumidos nas seguintes regras éticas:

Um DeMolay respeita o Criador acima de tudo;
Um DeMolay honra todas as mulheres;
Um DeMolay ama e honra os seus pais;
Um DeMolay é honesto;
Um DeMolay é leal aos seus ideiais e aos seus amigos;
Um DeMolay executa trabalhos honestos;
Um DeMolay sempre permanece inabalável na defesa das escolas públicas;
Um DeMolay é o orgulho da sua Pátria, dos seus pais, da sua família e dos seus amigos;
A palavra de um DeMolay é sagrada e sempre cumprida.

As sete virtudes cardeais de um DeMolay são: amor filial, reverência pelas coisas sagradas, cortesia, companheirismo, fidelidade, pureza e patriotismo.

Em suma, a Ordem DeMolay destina-se a orientar crianças e adoslecentes sobre os princípios corretos de vida.

Fontes:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ordem_DeMolay
http://www.cavaleirosdaluz.org/index.php?option=com_content&view=article&id=9&Itemid=10

Rui Bandeira

04 setembro 2013

Irmãos em campos diferentes


Estamos, em Portugal, a menos de um mês da realização de eleições autárquicas. Por todo o país se veem cartazes de propaganda eleitoral. Inevitavelmente que neste mês de setembro a atenção das pessoas é convocada para este tema.

Também os maçons não ficam indiferentes. São cidadãos e obviamente que se interessam e preocupam com a coisa pública e com a gestão das autarquias onde residem, onde trabalham, onde os seus filhos frequentam estabelecimentos de ensino. 

Naturalmente que, entre o apreciável número de cidadãos que se candidatam às diversas freguesias e diferentes municípios também existem maçons, um pouco por todo o país.

Em relação à Loja Mestre Affonso Domingues, num rápido cálculo, cerca de dez por cento dos seus obreiros são candidatos nas próximas eleições autárquicas ou estão diretamente envolvidos nas candidaturas, em várias autarquias da Área Metropolitana de Lisboa, em vários partidos e candidaturas independentes. Não é nada de anormal: não andará muito longe do ratio  entre candidatos e eleitores.

Na Loja Mestre Affonso Domingues existem mesmo candidatos à mesma autarquia por listas diferentes, ou seja, opondo-se entre si. Mais uma vez, nada anormal: em Maçonaria Regular, em Loja não se discute política nem religião. O que não pertence à Loja fica fora da Loja e, portanto, nenhum constrangimento esta situação gera. 

Mas o contacto entre os obreiros da Loja não se resume às sessões da Loja. Há o antes e o depois, há ágapes, há o normal relacionamento entre Irmãos que se conhecem alguns desde há apreciável lapso de tempo.  Também fora de Loja o facto de haver integrantes de diferentes candidaturas à mesma autarquia não gera qualquer desconforto ou desentendimento. Tem isso a ver, desde logo, com algo que os maçons cultivam e que muito útil é neste tipo de situações: a Tolerância.

A Tolerância consiste na natural aceitação das ideias, entendimentos e crenças do outro, mesmo quando diferentes das nossas - especialmente quando diferentes das nossas! É portanto natural para um maçom que o seu Irmão tenha ideias políticas diferentes das suas. E que as defenda. E que se candidate com base nessas ideias. Mesmo que essa candidatura seja concorrente da sua. Portanto, nada de mais existe no facto de haver na nossa Loja integrantes de candidaturas concorrentes às mesmas eleições na mesma autarquia.

Isto é o normal, o básico, o minimamente exigível em Maçonaria - e que, sem qualquer esforço é praticado na Loja Mestre Affonso Domingues.

Mas eu, do meu canto de veterano há muito retirado destas coisas da política, tenho verificado, com enorme satisfação, que os Irmãos interessados e integrantes das diversas candidaturas, na mesma ou em diferentes autarquias, não se limitam a este "mínimo olímpico" e vão, com toda a naturalidade, muito mais longe. Tenho verificado, com imenso agrado, que (sempre fora de Loja, naturalmente) os Irmãos candidatos não se limitam a não conflituar. Conversam sobre as respetivas candidaturas, expõem os seus projetos e planos e, mesmo, aconselham-se mutuamente, partilhando as suas experiências.

Vou assistindo a isto - bem de perto. E fico, naturalmente, muito satisfeito. Diria até que duplamente satisfeito, como cidadão e como maçom. Como cidadão, porque sei que aqueles que porventura forem eleitos serão capazes de, no respeito das suas convicções, bem servir o Povo que os elege, cooperando com os outros eleitos, independentemente das suas candidaturas de origem, no sentido de todos fazerem o melhor que puderem, com os meios de que dispuserem. Como maçom, porque vejo como a efetiva aplicação dos princípios maçónicos é útil, gera concórdia, permite cooperação.

É por estas e por outras que não me vejo a ser obreiro de outra Loja que não a Mestre Affonso Domingues!

Rui Bandeira