Maçonaria e Política
Outra variante é a que costumo designar de Maçonaria Liberal, ancorada na evolução sofrida pelo Grand Orient de France, na sequência de vários fatores: rivalidade franco-britânica, evolução das condições sociais em França (Revolução Francesa), inserção dos atores políticos na Maçonaria. Esta outra variante é em quase tudo consentânea com a primeira, com duas importantes exceções: por um lado, aceita a presença de agnósticos e ateus nas suas fileiras, fundamentando tal opção no princípio da Liberdade de Consciência e na não ingerência na convicção alheia (elevando o corolário da Tolerância ao primado de princípio, gerador, por sua vez, de um outro corolário, o laicismo); o entendimento de que a missão principal da Maçonaria é a melhoria da Sociedade (e não apenas dos seus membros, individualmente considerados), cabendo à Maçonaria pugnar pela realização da trindade essencial dos princípios políticos (Liberdade-Igualdade-Fraternidade) e trabalhar pela sua aplicação na Sociedade, mesmo por meios revolucionários, se tal se justificar, designadamente por inexistência de regime político democrático.
Como é sabido, a evolução histórica em Portugal ocorreu no sentido de que, muito cedo, a Maçonaria que se implantou e, durante muitos anos, em exclusivo existiu no País, foi a desta última variante.
Não é segredo para ninguém que o Movimento Republicano foi fortemente influenciado pelos Maçons da época, podendo mesmo dizer-se, creio que consensualmente, que a Revolução Republicana de 1910 foi fortemente influenciada, para não dizer mais, pela Maçonaria da vertente liberal.
Os principais políticos da I República foram - é sabido - maçons liberais. A esta luz, percebe-se melhor que, no dealbar do salazarismo, uma das medidas tomadas tenha sido a proibição da Maçonaria. Esta, sempre na sua vertente liberal, no entanto, foi conseguindo existir clandestinamente, com ligações aos opositores do regime de Salazar e, mais tarde, de Caetano. Restaurada a Democracia e novamente legalizada a Maçonaria, liberal, esta era constituída essencialmente por velhos republicanos e políticos e outros opositores ao regime derrubado. A nova ordem política pós-25 de Abril incluiu, em lugares de destaque, maçons liberais. Que se rodearam de quadros mais jovens que, atraídos para a política, também inevitavelmente o eram para a Maçonaria liberal. A vocação de intervenção política e social da Maçonaria Liberal pôde voltar a concretizar-se, após o derrube da Ditadura.
Só há cerca de 20 anos, foi introduzida formalmente em Portugal a Maçonaria Regular. Esta não tem, enquanto tal, qualquer intervenção política. Não é, assim, um local especialmente apetecível para políticos e candidatos a políticos.
Mas mais de um século de intervenção política da Maçonaria liberal deixaram marcas. Não admira que o comum das pessoas associe uma Maçonaria, a liberal, que assumidamente considera ter um campo de intervenção útil na Política, a «influência junto ao Poder Político» - particularmente quando, historicamente, a teve! Quanto ao "subir na vida" e aos "privilégios especiais", são fatores associados, no imaginário corrente, aos políticos, seus privilégios e idiossincrasias e, inevitavelmente, foram, nesse imaginário comum, por associação também aplicados à Maçonaria com atividade política, a liberal.
A Maçonaria Regular, aquela em que me incluo e se incluem os elementos da Loja Mestre Affonso Domingues, integrante da Grande Loja Legal de Portugal/GLRP, contrariamente ao ramo liberal, não tem intervenção política. Postula como seu objetivo o aperfeiçoamento individual dos seus membros. Forma consciências. E cada um, segundo a sua consciência, como livre-pensador que é, intervém onde entende, como entende, se entende. Agrupando livre-pensadores, a Maçonaria Regular não tem a pretensão (logicamente votada ao fracasso...) de pretender que esses livre-pensadores pensem todos de forma igual - por isso considera não ser sua vocação a intervenção política que, para existir de forma minimamente eficaz, implica alguma concordância de pensamento.
Atento o lastro histórico que existe decorrente da antiguidade da implantação da Maçonaria liberal no nosso País, é inevitável a existência da associação entre Maçonaria (liberal) e Política. A Maçonaria Regular, tendo uma firme orientação diferente, necessita de esclarecer bem a sua posição. Não quer que ninguém se interesse pelos seus princípios induzido em erro pelos condicionalismos históricos. Daí que esclareça, cuidadosamente, a questão. Daí que escreva e publique textos como Cinco motivos para NÃO SER maçom!
Rui Bandeira