21 novembro 2007

Interlúdio

Contra o que é habitual, ontem não foi publicado qualquer texto no A Partir Pedra. Tal ocorreu por avaria nas comunicações na zona de onde me ligo à Rede, precisamente quando, com o texto já escrito, seleccionava uma imagem para o acompanhar. Aproximava-se a hora do jantar - que, em minha casa, é um momento sagrado de reunião e convívio familiar - e não me foi possível aguardar pelo retomar das comunicações. Portanto, ontem as circunstâncias impuseram que não pudesse ser cumprido o propósito de, fora dos períodos de férias, o blogue ter sempre publicado, pelo menos, um texto em cada dia útil.

Fiquei levemente aborrecido, mas sou um optimista. E um optimista consegue sempre descortinar algo de bom no que corre mal, consegue sempre antecipar algum sol no meio de uma tempestade.

A pausa forçada permite-me reequilibrar um pouco a minha produção de textos aqui no blogue. Como tive oportunidade de referir aqui, este ano maçónico esperava que a minha contribuição para o blogue se cifrasse em dois textos por semana. Isso não se tem revelado possível. O reforço que se anunciava não se concretizou. Até agora, pelo menos. Os afazeres e as falhas de inspiração dos outros autores habituais de textos no blogue também os têm impedido de publicar mais assiduamente. Como resultado, para garantir o cumprimento do desejado objectivo de pelo menos um texto em cada dia útil, tenho tido necessidade de publicar quatro e, por vezes, cinco textos por semana.

Não me queixo. A publicação de textos no blogue é um acto voluntário, quem corre por gosto não cansa e quem não pode, arreia. Mas esta necessidade de garantir um ritmo elevado de publicação não deixa de me preocupar, sobretudo pelos possíveis reflexos na qualidade dos textos. Não é possível haver ópera todos os dias... E quanto mais dias houver função, menor será a proporção da ópera no meio da música...

A qualidade dos textos aqui publicados é para mim importante. Para escrever qualquer coisa de qualquer maneira, mais vale estar quieto e tentar fazer algo de mais útil... Procuro, portanto, escrever de forma a expor ideias, pensamentos, conclusões, que sejam dotados de alguma Sabedoria, que tenham alguma Força para inspirar ou influenciar quem lê e que sejam textos com alguma Beleza de escrita.

Porém, para escrever algo com uma sofrível Sabedoria é preciso reflectir. E quanto mais frequentemente se tiver que publicar, menos tempo se tem para reflectir no que se escreve...

Para escrever algo com a Força suficiente para marcar quem lê o texto, tem de se escrever convictamente. E a necessidade de publicar todos os dias obriga, por vezes, a escrever sobre detalhes, ligeirezas ou curiosidades, sobre os quais dificilmente se consegue transmitir convicção... Não que não haja lugar a textos sobre detalhes, ligeirezas e curiosidades aqui no A Partir Pedra. Claro que há, até por uma questão de saudável variedade de temas e estilos. Mas gostaria de poder programar mais descansadamente a mescla do sério com o ligeiro, para poder tentar até o ligeiro dotar de alguma Força...

Para escrever textos com alguma Beleza, com alguma qualidade de escrita, necessito de muita transpiração... Não sou um artista das letras, não escrevo particularmente bem, tenho consciência que mais não sou do que um medíocre alinhavador de palavras, um sofrível escrevinhador, um razoável divulgador de pensamentos. Mas, embora com reduzido sucesso, procuro, tento, teimo, que o que escrevo tenha, aqui ou ali, algo que possa ser considerado como não feio de todo. Para tentar não me distanciar muito desse objectivo, mister é que releia, emende, corrija, melhore o que a minha pouco inspirada mente vai dolorosamente expelindo. Mas a necessidade de publicar a um ritmo diário permite-me menos tempo para que o faça... E, no entanto, para mim é importante ter possibilidade de reler e aprimorar os textos que vou escrevendo, antes de os publicar. Nunca cesso de me surpreender como a simples alteração de disposição, de humor, entre o momento em que escrevi um texto e aquele em que o revejo, me possibilita aprofundá-lo com novos detalhes, enriquecê-lo com novas cambiantes, adorná-lo com mais uma ou outra imagem.

Procuro, sempre que possível, escrever com alguma antecedência, ter de um a cinco textos aptos a serem publicados, de forma a poder revê-los, melhorá-los, afiná-los, antes da publicação de cada um e, até, poder jogar com a respectiva ordem de publicação. Mas ultimamente isso não tem sido possível: os meus próprios afazeres nem sempre me têm permitido escrever todos os dia úteis e a reserva de textos foi sendo utilizada.

Procuro, pelo menos, escrever de manhã e só publicar ao fim da tarde, para ainda ter um tempinho para o meu subconsciente me ajudar a providenciar por uma ou outra afinação. Mas dias há em que nem isso tem sido possível, em que tenho escrito e imediatamente publicado. Resultado: quando releio o que já está publicado, mais frequentemente do que eu gostaria deparo com detalhes que deviam ter sido melhorados. E isso aborrece-me. Porque quem me lê tem direito ao melhor do que sou capaz, não apenas ao que saiu...

Portanto, a avaria de ontem teve o resultado positivo de me permitir uma pequena folga, que, espero, me ajudará a poder melhorar um pouquinho a qualidade do que publico. Porque ontem não publiquei e o texto que estava prestes a ser publicado fica de reserva para um dia destes (após revisão e aperfeiçoamento...) e hoje pude, a propósito, exercitar a minha capacidade de escrever sobre nada, ganhei mais um dia para reflectir sobre algumas coisas que ainda não tinha decidido se iria escrever sobre elas aqui no blogue - e que entretanto já deu para me decidir pela afirmativa -, de forma a que valha a pena escrever sobre elas. Escrever sobre nada dá-me tempo para reflectir sobre a substância do que escreverei um dia destes. Hoje, escrevi sobre a espuma de algo sem importância, enquanto me preparo para escrever sobre o âmago de assuntos bem mais importantes.

O que uma avaria propicia e o que a capacidade optimista de retirar algo de positivo do que corre mal possibilita!

Rui Bandeira

3 comentários:

Paulo M. disse...

"Não sou um artista das letras, não escrevo particularmente bem, tenho consciência que mais não sou do que um medíocre alinhavador de palavras, um sofrível escrevinhador, um razoável divulgador de pensamentos."

Não acho nada, nem me parece que o Rui se veja, de facto, sob uma luz tão parda, mas respeito a sua opinião enquanto "liberdade literária"... A verdade é que um blog não é uma obra de literatura - mas também não o é um jornal. O Rui tem pautado pela constância e pela boa qualidade dos seus textos - uns, de facto, mais inspirados do que outros - que traduzem, no seu conjunto, os genuínos "altos e baixos" que apimentam esta comunicação (quase) em directo. Ninguém espera que (re)escreva os Lusíadas à razão de um canto por dia.

A transmissão da Sabedoria depende pelo menos tanto da diligência de quem lê quanto da arte de quem escreve. Qualquer texto - mesmo um menos inspirado - terá, certamente, pontos de partida para quem se esforce por encontrá-los. A Beleza, mais do que intrínseca, está nos olhos de quem a vê. Onde uns vêem arte inspiradora e arrebatadora, outros vêem um amontoado de rabiscos; onde uns vêem harmonia e suavidade, outros depreciam dizendo que é tão pouco inspirador como uma fotografia... Não posso falar por todos, mas falo por mim: leio, gosto do que leio, e recebo com gratidão a oportunidade me iluminar mais um pouco.

Mas creio que percebo a sua questão, e creio que se deverá mais ao formato do blog do que à qualidade dos textos - ou do "escrevinhador". Muitos dos textos do A Partir Pedra mereceriam um destaque maior e ser elevados de categoria; em vez de arquivados por estrita ordem cronológica, mereceriam ser revistos e melhorados (eventualmente incorporando ideias presentes nos comentários), e convertidos em "artigos", "ensaios", ou o que lhes queira chamar, a ordenar por tema eventualmente no site da Loja. Quem sabe, poderiam até estar disponíveis em formato PDF, configurando assim uma espécie de "biblioteca virtual" ao alcance de todos. Claro que, para se dedicar a esta tarefa, teria que baixar a periodicidade da publicação no blog, ou encontrar quem o revezasse...

Até lá... continue assim.

Um grande abraço,
Simple Aureole

Nuno Raimundo disse...

Boas...

O ºsimple já disse tudo...


abr...prof...

Rui Bandeira disse...

@ simple e nuno_r:

Obrigado pelas palavras amáveis.
Ainda bem que ninguém es+era que reescreva Os Lusíadas, porque eu nunca o faria: na perfeição não se mexe!
Os textos do blogue não estão simplesmente arquivados por orem cronológica. Todos estão também referenciados por temas e é possível consultá-los utilizando o índice temático. A propósito, a análise dos temas mais procurados, até agora, mostram-me que se justifica a mescla de textos e temas mais sérios com textos e temas mais ligeiros: dos cinco temas mais procurados, três são mais "sérios" (Maçonaria - obviamente! -, Acácia e símbolos) e dois mais "ligeiros" (curiosidades e blogues outros).
Quanto à inclusão de textos no blogue no sítio da Loja, uma indiscrição: o novo webmaster da Loja está em processo de preparação da remodelação do sítio da Loja e já me comunicou que projecta colocar lá alguns dos textos do A Partir Pedra. Mas, quando essa remodelação ocorrer, se efectivamente ali serão colocadops alguns textos do blogue ou não, e quais, essa é matéria de decisão e escolha do webmaster da Loja, não dos autores de textos do blogue. Cada macaco no seu galho...
Quanto a :pdf e "biblioteca virtual" isso, para já é guitarra que supera em muito a capacidade das minhas unhas...
De resto, penso que qualquer compilação desse género, nessa forma ou noutra ainda está lomge de se justificar: o blogue ainda não tem, a meu ver, uma massa crítica de textos suficientemente qualificados para se encarar algo do género: Talvez daqui a mais ano e meio e mais 500 textos porventura comece a haver umas dezenas de textos com interesse para tal...