28 dezembro 2011

Exortação de mudança de ano



Segundo as notícias que chegam a Portugal, o Brasil vive um bom período, o otimismo medra na mesma proporção do desenvolvimento, espera-se que o ano de 2012 seja melhor do que o de 2011. Que assim seja!

Do outro lado do Atlântico, neste jardim da Europa à beira-mar plantado (expressão que se tornou um lugar-comum para designar Portugal e que é um verso do poema A Portugal, incluído no livro D. Jaime do hoje quase esquecido poeta oitocentista Tomás Ribeiro - e escrevo quase apenas porque uma movimentada rua no centro de Lisboa tem o seu nome; mas tenho poucas dúvidas de que a esmagadora maioria dos que nela passam não tem sequer uma vaga noção de quem foi, ou o que fez, o patrono de tal artéria), neste velho Portugal, cada vez mais velho, demograficamente falando, o panorama é bem mais sombrio: a seguir a um mau ano de 2011 espera-se um pior ano de 2012, o pessimismo está instalado em proporção superior à percentagem de queda do Produto Interno Bruto. Por estas bandas, os tradicionais, nesta época, votos de Feliz Ano Novo soam a esperança vã, palavras ocas, simulacro de boa disposição.

No entanto, também neste cantinho sudoeste da Europa, onde a terra se acaba e o mar começa (outro lugar-comum, este com origem num verso da vigésima estrofe do Canto III de Os Lusíadas, do muito lembrado, celebrado e invocado, mas hoje menos lido do que deveria, Luís de Camões) há lugar e tempo e modo para pôr o pessimismo no baú das coisas inúteis, ou, pelo menos, pouco usadas, e concentrar-nos no que de bom podemos encontrar em tempos que aparentemente variam entre o mau e o péssimo.

É verdade que os tempos por aqui (no velho Portugal, mas também, de uma forma geral, na não menos velha Europa) não andam propícios a prosperidades materiais para a esmagadora maioria dos que vivem do seu suor, labor e capacidades, sem acumulações de capitais que almofadem a dureza dos golpes com que a nova Grande Depressão vai fustigando os cidadãos comuns.

Os tempos de vacas magras (mais um lugar-comum, este vindo diretamente do bíblico Génesis, mais concretamente do sonho do Faraó, cujo significado perguntou ao israelita José - algo que nos dias conflituosos de agora parece quase impossível: um líder egípcio a aconselhar-se com um líder israelita...) têm, para o homem sábio, o potencial de o relembrar da abissal diferença entre o SER e o TER.

Os tempos europeus e lusitanos de agora são tempos de pouco TER. Não são, porém, tempos perdidos ou improdutivos para aqueles que se preocupam essencialmente, não com o TER, mas com o SER. São tempos que nos mostram e ensinam a diferença entre o que é verdadeiramente essencial e o que, afinal, é apenas simplesmente confortável. São tempos que nos alertam para a precariedade do TER e que nos mostram a perenidade do SER. Que - com dureza mas também com clareza - nos ensinam que o que possuímos, o que amealhamos, os rendimentos que obtemos, estão à mercê dos desvarios de anónimos financeiros, dos apetites de insaciáveis banqueiros, das debilidades dos políticos a que entregamos os nossos destinos, dos conceitos dos teóricos económicos da moda e do acefalismo cinzento dos burocratas que a todos estes enquadram. Mas são também tempos que nos relembram que o nosso verdadeiro tesouro é aquilo que SOMOS, o que aprendemos, o que melhorámos, as capacidades que adquirimos, a nossa força, tenacidade, confiança em nós, o conjunto das capacidades que laboriosamente adquirimos ao longo da nossa existência e que é com o que cada um verdadeiramente É que resiste e ultrapassa e vence a falta ou diminuição do que TEM, que reconstrói sobre os destroços do que caiu, que avança e deixa para trás o deserto da penúria. Enfim, aquele que se concentra no que É sente menos falta do que não TEM.

O essencial é SER, não TER. Os tempos de crise servem para que o homem sábio o relembre e possa não o esquecer nas épocas de prosperidade.

Todos aqueles que dão ou agora aprendem ou reaprendem a dar primazia ao SER sobre o TER estão mais aptos a, apesar dos pesares, ter aquilo que, sem ironias, sem descabelados otimismos, mas também sem desnecessários pessimismos, a todos desejo: UM FELIZ ANO DE 2012!

Rui Bandeira

3 comentários:

JPA disse...

A historia mostra-nos que não aprendemos.
O ter encobre o ser.
Teimamos em ser menores.

Um bom 2012
JPA

Nuno Raimundo disse...

Boas Entradas em 2012, e que no ano vindouro não seja tão mau como tanto se diz...
Abraços

Bartolomeu Dias disse...

Mais uma excelente prosa do ORui Bandeira, a merecer os maiores encómios. PARABÉNS! FELIZ ANO DE 2012!