12 março 2014

O Vigésimo Terceiro Venerável Mestre


Foi eleito para o exercício do ofício de Venerável Mestre em julho de 2012. Foi instalado na Cadeira de Salomão no início do ano maçónico de 2012/2013, para exercer o ofício até à instalação do seu sucessor, prevista para ocorrer no início do ano maçónico subsequente.

Sucedeu ao Venerável Mestre que aqui referi ter sido, na Loja, "talvez o maçom que mais bem preparado foi e estava para assumir o ofício de dirigir a Loja quando tal lho foi solicitado pelo conjunto dos obreiros" e cujo "mandato começou bem, prosseguiu agradável e terminou melhor. Elevou muito a fasquia para os seus sucessores".

Rui S., o Vigésimo Terceiro Venerável Mestre, não tinha, assim, tarefa fácil - e tinha consciência disso. As suas caraterísticas pessoais eram diferentes das do seu antecessor. Onde este era organizado, Rui era espontâneo. A um cultor da organização e da programação, sucedeu um afável e gregário gestor de iniciativas que privilegiava o momento, a integração do inesperado.

Nuno L. organizara a Loja com rigor. Rui S., com a noção de que o trabalho de organização estava feito, no essencial, procurou catalisar a Loja para as organizações. Com a casa arrumada, entendeu ser o momento de a Loja organizar iniciativas abertas ao exterior. Estimulou a realização de eventos sob a égide da pessoa coletiva que confere personalidade jurídica à Loja, a Associação Mestre Affonso Domingues, seja em organização própria, seja em colaboração com terceiros.

Duas vertentes distintas marcaram essas realizações. Por um lado, atividades sociais envolvendo os obreiros da Loja e suas famílias, no reforço dos laços entre todos. Foi o caso, por exemplo, de uma visita programada e guiada a Palmela, de uma segunda - e diferente da primeira - visita guiada a locais de Lisboa com interesse maçónico e de uma visita à Loja João Gonçalves Zarco, que trabalha ao Oriente do Funchal, complementada com um programa social pensado tendo em vista também as famílias que se deslocaram acompanhando os obreiros visitantes. Por outro, o apoio a organizações e eventos de caráter cultural, de que refiro, a título exemplificativo, uma exposição de fotografia de dois obreiros da Loja e uma outra exposição organizada numa aldeia do distrito de Lisboa.

O ano de mandato do Rui S. foi, assim, um ano de sucessivos eventos e organizações. Foi um ano de fazer, de executar, de reforço de laços entre os obreiros da Loja e suas famílias. Foi, sem dúvida, um ano agradável.

Mas todo o verso tem o seu reverso e este período também teve algumas implicações ou consequências negativas. A pujança da Loja manifestava-se externamente, mas descurando-se um pouco o que se tinha por adquirido, a sua organização interna. E ocorreu algo que se revelou mais difícil de ultrapassar: a imagem de pujança que externamente a Loja transmitiu  levou naturalmente a que esta fosse solicitada a colaborar no lançamento de outros projetos, de outras Lojas, cedendo alguns dos seus obreiros. Em pouco tempo, apenas num ano, a Loja cedeu  vários obreiros seus para lançamento de outras Lojas. O próprio Rui S., no final do seu mandato, anunciou que não asseguraria a função de Ex-Venerável Mestre (o principal conselheiro do Venerável Mestre em exercício), porque iria, pelo menos por seis meses, dirigir uma nova Loja. O ano de realizações foi também o ano em que a Loja teve de abdicar de um significativo número de quadros que formara e com que contava para a direção dos seus destinos nos anos mais próximos.  Na esteira da sua tradição de organização de doações de sangue, a Loja deu boa parte do seu sangue para novos e outros projetos... A Loja ficou assim com o número de Mestres ativos consideravelmente reduzido.

Porém, ela tinha no seu seio a solução para o problema que surgira. Nuno L. deixara a Loja com um quadro de Companheiros bem guarnecido, ainda reforçado no decorrer do mandato de Rui S.. Foi apenas uma questão de apressar a ultimação da formação destes elementos e preparar o seu acesso a Mestres Maçons. No final do mandato de Rui S., a Loja estava pronta para reguarnecer o seu quadro de Mestres. O ano seguinte seria dedicado a essa tarefa e à rápida integração e preparação destes para a subsequente assunção dos destinos da Loja.

A sucessão de realizações no período de mandato de Rui S. implicou ainda um outro preço: foram mobilizados fundos da Loja e, no final do ano, feitas as contas, os fundos disponíveis tinham baixado consideravelmente. A Loja não estava em dificuldades financeiras, longe disso, mas tomou consciência de que era também necessário reequilibrar a vontade de fazer coisas, organizar, com as disponibilidades económicas reunidas e disponíveis. 

O ano de liderança do Rui S. foi um ano de agradável fruição do que se reunira, do que se obtivera. Mas foi também um ano que mostrou que era necessária a definição de justos e prudentes equilíbrios: equilíbrio entre a capacidade e "velocidade" de formação de quadros e a possibilidade de dispensar quadros formados para lançamento de outros projetos; equilíbrio entre a vontade de organizar, fazer, com a necessidade de manter organizada e equilibrada a retaguarda de funcionamento burocrático e de financiamento da Loja.

Com o Rui S., a Loja aprendeu algo que era a altura de aprender: a necessidade de equilíbrio, a conveniência de se organizar de forma a que nunca se venham a dar passos maiores do que a perna. Em linguagem de estratégia militar, aprendeu que a vanguarda não pode avançar sem a preocupação de manter garantidas as linhas de abastecimento. No caso da Loja Mestre Affonso Domingues, avançou-se, fez-se, realizou-se. Mas houve a lucidez de entender que as "linhas de abastecimento" (de quadros e de meios financeiros) estavam a ficar fracas e que era necessário reforçá-las. E, portanto, de decidir fazer uma pausa nas realizações externas para proceder aos necessários rearranjos e reforços.

Com o Rui S., a Loja tomou consciência dos seus limites. E não os ultrapassou, antes parou e providenciou as necessárias correções. Porque assim fez, ficou melhor e mais forte. Porque identificou em tempo as suas debilidades e as causas delas e se preparou para as corrigir em tempo útil. Aprendeu assim que os avanços não são sempre em linha reta e sem pausas. Há que saber consolidar para voltar a avançar. Há que reparar brechas nas fileiras antes de prosseguir. Esta lição espero que seja recordada no futuro da Loja. Porque é a diferença entre a pujança da juventude, quando se pensa que o mundo é nosso e tudo se pode fazer, e o equilíbrio da maturidade. A Loja Mestre Affonso Domingues, na sua juventude de vinte e três anos está a aprender a ser madura!

Rui Bandeira

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