09 novembro 2015

Jorge Manuel do Carmo Pereira de Almeida (1958-2015), maçom afável



Para alguns de nós era o Jorge Pereira de Almeida. Outros conheciam-no melhor por Manuel do Carmo, parte do seu nome que utilizava enquanto autor e artista plástico. Ele era ambos e ambos eram um só, ele, um maçom afável, que era estimado por todos os elementos da Loja que com ele privaram.

Foi advogado, autor de quinze livros publicados sobre relações internacionais, arte e filosofia (só para referir três: Um Café pelo Aqueduto (Dinalivro), O Método Alternativo (Guimarães Editores), Caixa para Pensar (Verbo), o seu último trabalho editado), empresário, artista plástico. Foi assessor da Presidência do Conselho de Ministros no VII Governo Constitucional, professor de Relações Internacionais no ISLA, assessor na Fundação Oliveira Martins, Presidente da ONG Latin American Studies Institute, e fundador e Presidente da Manuel do Carmo Foundation, organização sem fins lucrativos sedeada em New York com o objetivo de angariar fundos para promover o diálogo entre as culturas europeia e norte-americana.

Foi tudo isso, teve uma vida cheia e produtiva. Mas foi, para nós acima de tudo o mais, um dos nossos, da Loja Mestre Affonso Domingues. 

Infelizmente, os mais novos não tiveram oportunidade de contactar com ele. Há vários anos lidando com sérios problemas de saúde, não lhe era possível comparecer na Loja. Os contactos com ele eram sobretudo telefónicos, sobretudo para ir sabendo como ia ele lutando com as doenças que o afetavam. Apesar da gravidade das suas doenças, manteve sempre uma inesgotável força, força de viver, de lutar contra a doença, de superar e de se superar. E também um assinalável otimismo. Mesmo ao telefone, sentia-se o sorriso que embalava a sua conversa. Esse otimismo manteve-se até ao limite da impossibilidade, até ao momento em que ficou evidente que não venceria a sua luta. Quando isso sucedeu, a sua fibra continuou a revelar-se e sobreveio a apaziguadora resignação, sempre de mãos dadas com a sua proverbial boa disposição. A forma como lidou com as suas doenças, como encarou com naturalidade a perspetiva da sua mais próxima do que longínqua morte, a serenidade (é a palavra certa) com que encarou o fim, estando já muito próximo dele, foi um exemplo para todos nós.

Aliás, hesitei um pouco em o adjetivar como maçom afável ou como maçom sereno. Teve ambas as qualidades. Optei pela primeira qualificação, quer porque foi qualidade que manteve sempre, na saúde e na doença, nos tempos felizes e nas alturas agrestes, quer porque foi talvez a caraterística mais marcante para todos os que com ele privavam.

O Jorge estava bem em qualquer lado, com qualquer pessoa. E sobretudo foi um homem que lidou sempre com os outros com uma extrema amabilidade, sempre atencioso, sempre calmo e sorridente, sempre dando a sensação de que ouvia o que lhe diziam com a máxima atenção, sempre fazendo com que cada um se sentisse como o mais importante para ele, ali e naquele momento. O Jorge não se limitava a ser educado, a ser amável, a ser atencioso. O Jorge era tudo isso e transmitia ainda o gosto de estar a falar com o interlocutor. Mesmo quando porventura discordava dele, isso não impedia que o interlocutor sentisse que era um prazer debater com ele, que as concordâncias ou discordâncias eram menos detalhes, que o importante era estarem juntos e conversarem e trocarem pontos de vista.

À medida que a sua saúde se deteriorava, a nossa preocupação aumentava. O Irmão Hospitaleiro foi visitá-lo e encontrou-o já muito enfraquecido, muito frágil. Tinha a noção que o seu fim neste plano de existência estava próximo. Encarava o facto com serenidade, escudado na sua fé de que a morte não era o fim, mas apenas uma passagem. Mesmo frágil, mesmo fraco, mesmo vendo a morte já tendo virado a esquina e aproximando-se, interessou-se em saber dos demais irmãos da Loja. Ao saber que íamos homenagear o nosso decano (em idade), fez questão lhe oferecer um dos seus últimos trabalhos, e um outro à Loja, confiando-os ao Irmão Hospitaleiro para que os entregasse aos destinatários, e solicitou que o irmão decano que ia ser homenageado lhe autografasse um dos seus (dele, decano) livros. Infelizmente, não foi já possível devolver-lhe o livro autografado... 

O Jorge Pereira de Almeida, o Manuel do Carmo, teve uma vida cheia e bem sucedida. Nós recordá-lo-emos sobretudo pela caraterística que mais nos tocou: como um Irmão extremamente afável, com quem foi sempre um prazer privar e que nos deixa saudades. Voltaremos a encontrar-nos quando trilharmos o mesmo caminho em que ele nos precedeu. E de algo estou certo: o nosso reencontro será agradável, como agradável foi sempre o nosso convívio.

Até ao nosso reencontro, Jorge!

Rui Bandeira  

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