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05 maio 2010

Réplica e tréplica


Na sequência dos textos A viagem e Repto aceite, Diogo apresentou a seguinte réplica:

Confesso que no meu comentário anterior me desviei da alegoria de Charles Evaldo Boller para mergulhar de cabeça nos aspectos físicos da questão. Com isso ter-me-ei agarrado ao acessório científico e perdido o essencial do pensamento filosófico do autor. Peço desculpa ao Rui por isso. Li e reli de novo o artigo. Não consigo deixar de fazer um paralelismo entre a maçonaria e um misto de teísmo [O Grande Arquitecto, o Sol que tudo ilumina] e de Budismo – a constante procura da perfeição pessoal: Retirado de “O que é o budismo?” - «no entanto, o praticante Vajrayana iniciado nas instruções secretas, muitas delas dadas somente de mestre para discípulo oralmente, também denominadas, verdades sussurradas ao ouvido, iria pelo rio em busca das bagas venenosas, para as retirar directamente do rio, e assim todos poderem livremente beber a água o mais rápido possível.» Mas eu sou ateu. A minha filosofia de vida é aprender o mais possível (não num sentido moral) e fazer conscientemente o máximo de bem e o mínimo de mal. Bom, posto isto, vamos então ao debate: Rui: «E, desculpar-me-á o Diogo, mas a sua afirmação de que, na ausência de um terceiro ponto de referência nem sequer se pode afirmar que há movimento, não está certa: se variar a posição relativa entre o ponto A e o ponto B, é indesmentível que há movimento. O que pode desconhecer-se, na ausência de um terceiro ponto de referência, é se o movimento foi de A, foi de B ou foi de ambos...» Sem um terceiro ponto de referência não pode afirmar que há movimento. O movimento é sempre relativo. A move-se em relação a B em função de C. Mais, o movimento é uma função do espaço e do tempo. Pior, o tempo é uma função de um movimento em relação a outro movimento. Enfim, uma grande salgalhada. Evidentemente, estou a falar num sentido estritamente físico, o que não era a intenção do autor. Quanto ao ponto 4 – O que é o Tempo? Há algum relógio universal a medir o Tempo? Rui: «Esta pergunta, Diogo, tenho-a por retórica... Então o nosso céptico, hiper-racionalista Diogo esqueceu-se da teoria do Big Bang e de que ela postula que com o dito cujo se criou o Universo, o espaço e o tempo (conferir http://pt.shvoong.com/exact-sciences/496537-teoria-da-grande-explos%C3%A3o-big/)? Meu caro Diogo, essa sua pergunta deveria ter sido formulada ao Einstein, não ao Irmão Charles Evaldo Boller... Não lhe faço a injúria de considerar que estava a colocar esta objeção a sério... Assentemos em que estava só a testar se eu estava distraído...» Estou a falar muito a sério Rui. Tanto a teoria da relatividade como a do Big Bang estão muito longe de estarem confirmadas. Eu estou convencido que ambas estão erradas. Acredito num Universo infinito e estacionário, sem princípio e sem fim. Quanto ao ponto 5 – Mas haverá matéria sólida? Se continuar a diminuir de tamanho e entrar dentro dos núcleos dos átomos e dos electrões não irá perceber que afinal todo o Universo é apenas energia? «Meu caríssimo Diogo, está a objetar a quê? Esta sua afirmação é precisamente a afirmação do texto do Irmão Charles Evaldo Boller...» - estou de acordo consigo. Quanto 6 - «Será que legitima a expressão do penso, logo existo, de Descartes? » - também estamos de acordo. Rui: «Para cada argumento que se possa aduzir em abono de que Deus existe, existe um argumento com igual força que o refuta; para cada argumento que se apresente demonstrando que Deus não existe, existe um outro, de igual fortaleza que defende essa existência.» Onde é que o Rui foi buscar este postulado? Rui: «à pergunta quem criou o Mundo?, respondem os crentes que foi Deus; mas de imediato surge então a irrespondível pergunta de quem criou Deus?; similarmente, a tese da Ciência contemporânea de que o Universo teve origem num Big Bang é reduzida à sua dimensão de nada realmente explicar se se pergunta o que (ou quem...) criou, originou esse Big Bang, como e de onde surgiu essa tão fenomenal e extraordinária Força que do Nada fez surgir o Tudo. E, sendo postulado da Ciência que tudo o que existe pode ser reproduzido (e nisso se baseia a Ciência Experimental), como se explica que, desde há biliões e biliões de anos, só haja conhecimento de UM Big Bang, quando seria de esperar uma repetição do fenómeno?» Como lhe disse acima, a teoria do Big Bang está muito longe de estar provada. Eu não acredito nela. De qualquer forma, um Deus, qualquer Deus, teria de ser considerado um ser vivo por mais imaterial que o consideremos. Ele não pensa? Não age? Rui: «Respondendo directamente às suas perguntas, Diogo, o significado da Vida e da criação (ou da primitiva aparição) da Vida é o Grande Enigma. Uns, como eu, crêem só poder ter sucedido e existir pela intervenção de um Poder Criador (que eu designo por Grande Arquiteto do Universo); outros acreditam que a Vida surgiu de uma enorme e incalculável sucessão de acasos cumulativos, que superam em milhões de milhões de milhões (e ponha ainda mais milhões aí...) de vezes as probabilidade de ganhar o Euromilhões. Por mim, tudo bem: cada um acredita no que acredita. Mas, se eu sou crente, quem acredita nessa incalculável megassucessão de mega-acasos, o que é? Talvez... crédulo???» Curiosamente, eu também não sou darwinista e portanto também não acredito que a vida e a evolução sejam fruto do acaso. Mas o que é a vida? Entre as muitas dezenas de descrições que podemos encontrar aqui – http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:http://pt.wikipedia.org/wiki/Vida - uma diz que: «Vida é um sistema que reduz localmente a entropia mediante um fluxo de energia» Donde, será aquilo a que chamamos vida apenas um aglomerado relativamente vulgar no Universo de matéria e energia? Moléculas com um determinado comportamento? Algo, afinal, sem nada de mágico? Quanto ao ponto 9 - «O caminho para a liberdade e perfeição do maçom é dominar suas paixões com o objectivo de acabar com atitudes extremadas e fanáticas. E a vereda do espírito passa pela capacidade de sonhar, com grandes chances de converter a fera humana, apenas controlada pelas leis, em ser humilde diante da grandiosidade do que daqui divisamos. » Rui, aqui não vou discutir consigo. Você já sabe a minha opinião.

E eu formulo a tréplica que se segue:

Uma vez que Diogo reconhece que as suas primitivas críticas ao texto A viagem não tiveram em consideração o caráter alegórico do mesmo, tenho-as por retiradas.

De factual ou científico, a única diferença de opinião que, se bem ajuízo, resta entre Diogo e eu próprio é a questão da necessidade de um terceiro ponto de referência para a verificação se, entre um observador A e um ponto B, algum deles, ou ambos, se movimentam(m). Questão menor, convenhamos. E que, para a economia do debate das nossas ideias e do aprofundamento delas me parece perfeitamente lateral. Desde já declaro não ser um especialista da matéria (aliás, já o declarei neste blogue, considero que não sou especialista de nada, a não ser, hipoteticamente, um "especialista em ideias gerais"), pelo que a minha posição é meramente empírica. E como melhor ilusto as minhas ideias com imagens, procure o Diogo ver a razão da minha afirmação - de que discorda: imagine-se num comboio que, a certa altura, parou numa estação, e está a olhar pela janela. Do lado de lá dela, está um outro comboio, igualmente parado e, olhando pela janela, em sua direção, está uma bela mulher que chama a sua atenção, ao ponto de só a fixar a ela e nada mais. (Temos outra situação de observador A e ponto B e nada mais - que capte a atenção, pelo menos). A certa altura, a sua perceção é que a mulher que fixa se está movimentar para a sua direita. Dois pontos, um observador e o observado. O observador, sem necessidade de mais qualquer ponto de referência, regista a existência de movimento. Precisa efetivamente de um terceiro ponto de referência é para determinar se é o comboio "dela" que suavemente se movimenta, ou o "seu" (ou ambos, eventualmente). Dito isto, não procuro convencer o Diogo de nada, tal como certamente o Diogo não espera convencer-me do contrário do que afirmei. Fique cada um com a sua convicção - e felizmente que esta matéria é de irrisório interesse para nosso debate.

Diogo introduz a sua réplica com uma afirmação interessante e que eu não vejo motivos para rejeitar liminarmente: afigura-se-lhe que a Maçonaria será um misto de teísmo e budismo. É uma forma curiosa de pôr a questão. E é, no meu ponto de vista, irrespondível: a Maçonaria defende precisamente o máximo de liberdade da interpretação individual dos fenómenos. Certamente algumas pessoas partilharão facilmente da curiosa interpretação do Diogo, algumas outras dela discordarão, outras ainda tenderão a concordar, mais ou menos difusa ou parcialmente com a mesma. Em termos de ética maçónica a única reação a ter é registar a tese, respeitá-la e integrá-la como mais um elemento para a nossa própria análise. Ou seja: o Diogo tende a considerar a Maçonaria um misto de teísmo e budismo. Tudo bem, é a sua análise, que não é, de todo, inverosímil. E mais não há que comentar...

O outro aspeto da réplica de Diogo que considero merecer especial realce é o conjunto de proposições que começa com a sua afirmação de princípio (que é esclarecedora e que também só pode merecer uma atitude de respeito pela mesma) de que se considera ateu. Fica esclarecido. Nada a comentar ou objetar. Já na sua réplica especificada, Diogo formula ainda uma reveladora e (para mim) inesperada consideração: está pessoalmente convencido que, quer a teoria da relatividade, quer a teoria do Big Bang estão erradas. E prossegue declarando que acredita num Universo infinito e estacionário, sem princípio nem fim. Estas afirmações de princípio de Diogo abrem, creio, um campo de análise porventura interessante e que talvez o próprio Diogo não tenha ainda detetado.

Não vou tecer qualquer crítica ao entendimento expresso pelo Diogo - isso seria a violação daquilo que, como maçom, acredito dever-lhe: respeito e tolerância pela sua opinião. Nem vou procurar aproveitar-me para extrair conclusões porventura indevidas das suas proposições. Pretendo apenas contribuir para uma reflexão - de quem me ler e do próprio Diogo, em particular. Vou, portanto, formular apenas algumas perguntas. As respostas cada um as dará. O Diogo em particular, em especial no íntimo de si mesmo - onde não tem de temer reações, nem necessita de ninguém impressionar.

Já reparou o Diogo que as caraterísticas que atribui ao Universo que concebe (infinito, estacionário, sem princípio nem fim - portanto, eterno) são aquelas que os crentes atribuem à Divindade? Já reparou que eu poderia descrever o Grande Arquiteto do Universo nos mesmos termos? Será que o ateu que o Diogo se declara afinal se limita a transferir a resposta ao Grande Enigma da Divindade para o Universo? O que é então esse Universo infinito, estacionário, eterno? Não será afinal o ateu Diogo afinal um crente no panteísmo? Não andaremos afinal todos a falar da mesma coisa - só que chamando-lhes nomes diferentes?

Se assim o entender, pense o Diogo, calma e maduramente, nestas questões e nas que estas sugerem. Mas faça-o apenas perante si mesmo. Não com o intuito de refutar outrem ou de concordar com quem quer que seja. Apenas para aprofundar efetivamente as suas ideias, as suas dúvidas, as suas certezas,os seus desconhecimento. E tirar as suas conclusões. Que - se o Diogo for como eu - serão sempre provisórias. E serão suas. Que ninguém tem o direito de criticar ou pôr em causa. Que guardará para si ou partilhará com quem entender, quando entender, se entender.

É esta a felicidade e glória de ser Humano! Seja-se maçom ou profano, ateu ou crente, teísta, ateísta, budista, deísta, panteísta ou outro "ista" qualquer!

Rui Bandeira

21 abril 2010

A viagem


Hoje, resolvi elevar a qualidade deste blogue até ao nível que os seus leitores merecem e, obviamente com a devida e indispensável autorização do seu autor, publico aqui um texto que descobri através do Grupo Maçônico Orvalho do Hermon e que foi já publicado, pelo seu autor, no seu blogue Segredo Maçônico. O texto é um pouco longo, mas vale a pena lê-lo e, sobretudo, a partir dele meditar. Eis, portanto, da autoria de Charles Evaldo Boller, Mestre Maçom da Augusta e Respeitável Loja Maçônica Apóstolo da Caridade, n.º 21 da Grande Loja do Paraná,


A VIAGEM

Acompanhe-me numa singular viagem.

Para isto é necessário que você aceite alguns postulados e a pouca consistência do que mostrarei, considerando que, em essência, tudo não passa de simples fantasia, mas os conceitos são os mais modernos de que a ciência dispõe. Façamos à semelhança de nossas lendas na Maçonaria, que mesmo em sendo ficções, pretendem transmitir profundos conhecimentos filosóficos, dependendo apenas do grau de interesse e desenvolvimento de cada indivíduo e da perseverança em alcançar o conhecimento que leva a educação natural.

Tenha certeza que a pretensão é flutuar por caminhos fascinantes que poderão revelar entendimento de verdades complexas e difíceis de explicar de outra forma.

Preparando o Ambiente da Viagem

Façamos de conta que estamos parados no centro de uma loja aberta ritualisticamente. Aparelhada com todos os instrumentos de trabalho do maçom, bem como sua matéria prima: a pedra bruta.

Esotericamente falando, o teto não existe, então, vamos tirar de vez esta cobertura do lugar de onde está e empurrá-la para bem longe, tão longe que desapareça. Descortina-se sobre nós o espaço infindo e ao longe brilha o sol.

Empurremos também as paredes de nosso templo para bem longe. Estamos no centro do espaço infindo que só não é totalmente negro porque a luz do luzeiro o ilumina.

Eliminemos igualmente o piso de nosso templo, afastando-o mais devagar para que nossa mente se acostume lentamente com o flutuar no espaço. Como não temos mais referenciais, não sabemos ao certo se é o piso da loja e a Terra que estão se afastando, ou se somos nós que estamos levitando, viajando espaço afora.

Se pensar que paramos aí, enganou-se, agora possuímos poderes sobrenaturais que nos permitem parar o tempo, o que fazemos.

Este é nosso novo Universo: nada ao nosso redor, o tempo parado e apenas o Sol a nos iluminar. Neste ambiente especial construído por nossa imaginação, apenas nós nos movemos. Estamos sem ponto de referência a não ser o sol. Longe de tudo. Não existe ruído ou necessidade de ar. Somos poderosos.

Olhamos ao redor e observamos a imensidão. Como é diminuta a nossa estatura em relação a este Universo ilimitado e sem horizonte.

Com nossa nova capacidade de imaginação deixamos nosso corpo material e flutuamos para fora de nossa prisão. Olhamos para as pedras brutas que somos pelo seu lado externo de formas como nunca nos foram dadas observar. Observamos como é nosso túmulo material. Como já aprendemos, o que este corpo tem por fora é mero invólucro de nossa manifestação material no Universo tridimensional, o importante desta massa é seu conteúdo interno, algo que aos olhos materiais é impossível identificar.

Foi devido a esta limitação que saímos de nossos túmulos materiais e estamos aqui fora olhando para eles.

Aqui somos finitos e infinitos. Nesta existência artificial não rege tempo ou matéria, não existe início ou fim. Todas as coisas materiais que possuímos em nossa efêmera vida material são nada se comparados com a imensidão que ora contemplamos ao lado de fora de nossos cárceres que nos servem apenas como instrumentos de nossas experiências sensoriais.

Locke defendeu que as idéias são formadas a partir de experiências sensoriais exteriores e que a reflexão interior colocava em seu devido lugar. Combateu o Inatismo, filosofia que parte do pressuposto do homem possuir idéia inata do Grande Arquiteto do Universo; que esta idéia já nasce com a pessoa. Vamos comprovar esta assertiva ao sairmos do nosso corpo apenas por força de nosso pensamento e levarmos junto conosco apenas nossas capacidades de ver e pensar.

Na Maçonaria nos é ensinado que nascemos livres porque nascemos racionais e os seres humanos são, por isto, considerados iguais, independente de governos e outros homens. Usamos desta experimentação sensorial não apenas através de nossos dispositivos de percepção da realidade, criamos uma nova percepção, pela fantasia, e por um exercício do pensamento estamos passeando fora de nossos corpos físicos pelo espaço infindo.

Parece insanidade, mas é divertido. E como diz Domenico de Masi: não sei se estou trabalhando, aprendendo ou me divertindo.

Os trabalhos do Rito Escocês Antigo e Aceito querem demonstrar ser o homem infinito e que suas posses são finitas. Locke concebe o infinito como resultante da unidade homogênea de espaço, número e duração, e o que diferencia uma da outra é que o infinito apenas não tem limite. Deduzimos que o homem material é finito enquanto presa da materialidade e torna-se infinito quando desperta para a liberdade da razão apoiada pelo conhecimento.

É isto a que este passeio conduz.

Início do Passeio

Percebe quão devagar estão nossos passos neste passeio? Não há necessidade de correr. Nossas experiências mais eficientes não ocorrem sempre aos saltos, mas em pequenos avanços de uma dimensão para a outra de um conhecimento alicerçando o próximo, ciclos eternos de tese, antítese e síntese. Assim se faz na Maçonaria. O salto é dado pela mente e não pelo corpo material. É disto que devemos nos libertar para penetrar nos segredos de nós mesmos. Apenas em condições especiais obtemos a verdadeira luz para investigar a verdade oculta em nós mesmos. Nossa fantasia cria o ambiente, nossa racionalidade preenche os vazios.

Se olharmos todo o trajeto que nos trouxe até aqui é realmente um salto imenso para a nossa pequenez de criatura vivente do espaço tridimensional. Aqui só existe a noção de espaço porque trouxemos junto conosco as carcaças que nos contêm. Qualquer forma que adotarmos, seja ela material ou assim como nos imaginamos agora, não passamos todos de simples viajantes espaciais, é o que todos somos; astronautas deslocando-se permanentemente pelo espaço sideral numa velocidade estonteante a um destino desconhecido.

Vamos diminuir de tamanho, aliás, nós não temos dimensão, podemos ser imensamente grandes ou infinitamente pequenos, basta querer. Nossa mente vai fazer com que diminuamos de tamanho lentamente, porque ainda faz pouco tempo que abandonamos nossa clausura física e adentramos nesta nova condição de existência.

Vamos encolher até que possamos entrar pelo ouvido do meu corpo material aí em frente e que conheço bem, haja vista que já fiz alguns passeios dentro dele ultimamente. Vamos diminuir de tamanho até que possamos divisar as moléculas desta carcaça.

Percebeis como meu corpo está desaparecendo?

O corpo está se dissolvendo lentamente.

Porque será?

Um Universo Interior

Boyle foi o primeiro que não aceitou mais as teorias de Aristóteles dos quatro elementos: água, terra, ar e fogo e formulou as bases e conceitos dos elementos químicos.

A diversidade de moléculas com que um corpo físico é composto é enorme, então escolhamos a primeira molécula que encontrarmos e vamos continuar a diminuir de tamanho para podermos abordar um dos átomos.

Sabia que não foi Boyle quem criou a idéia de átomo? Isto já foi cogitado na antiga Grécia, por Demócrito; é dele a idéia que os materiais são formados por partículas minúsculas. Hoje dispomos deste conhecimento porque estamos apoiados nos ombros de gigantes do passado.

Pode-se dizer que o átomo é formado por duas regiões que ocupam o espaço: o núcleo, que é seu centro compacto e pesado, e uma coroa ou eletrosfera. No núcleo estão os nêutrons e prótons e na eletrosfera movem-se os elétrons em diversas órbitas.

Rutherford sugeriu que o tamanho do átomo seria algo em torno 0,000.000.01 centímetro. Para imaginarmos melhor o significado desta dimensão consideremos o homem do tamanho de um átomo e toda a população da Terra caberia na cabeça de um alfinete e ainda sobraria muito espaço.

E nós estamos do tamanho de um átomo agora.

Só que não vemos nada.

Por quê? Se moléculas das mais diversas compõem um corpo físico, elas deveriam estar em todo lugar, trilhões delas deveriam estar presentes aqui, e deveriam obliterar a luz do sol.

Onde estarão?

A eletrosfera de um átomo é cerca de 10.000 a 100.000 vezes maior que o núcleo. Então, porque não estamos vendo nada?

Vamos diminuir mais umas 100.000 vezes o nosso tamanho. Ainda não vemos nada. O corpo pelo qual estamos viajando simplesmente sumiu. O que existe ao nosso redor é apenas espaço vazio. Só a luz do sol chega até nós.

Continuemos a procurar até encontrar um núcleo de átomo, formado de prótons, nêutrons e outras partículas insignificantes, e assim como nós, desloca-se solitário nesta imensidão do espaço. É do tamanho de uma laranja, e cabe em nossa mão.

Onde estará o elétron que faz par com este núcleo?

Sabemos que a massa do elétron tem em torno de 1.840 vezes menos massa que o núcleo. Muito pequenos para serem vistos, mesmo com estes olhos que temos agora. Temos que diminuir ainda mais de tamanho para divisar corpúsculo tão diminuto, será por isto que não vemos o elétron?

Não! Ele não é visto porque nós paramos o tempo, lembra?

Somos criaturas muito poderosas em nosso mundo de fantasia.

O elétron deste átomo está parado em algum lugar que pode estar em termos proporcionais a nossa atual estatura a alguns quilômetros daqui, ou até bem perto como alguns centímetros. Não o vemos apenas devido suas dimensões relativas diminutas.

Estou cansado. Vamos diminuir mais nossa estatura, até ficarmos tão pequenos que possamos sentar confortavelmente sobre o núcleo deste átomo.

Ainda não vemos o elétron, e teríamos que encolher ainda cerca de quase umas 2.000 vezes a nossa atual estatura, e ainda assim seria muito difícil encontrá-lo.

Vamos restaurar o fluxo do tempo.

Não se assuste com a escuridão!

Consegue imaginar o que aconteceu?

Porque esta escuridão súbita?

São os elétrons! Eles nos deixaram cegos! Esconderam o Sol.

O Mundo Material

Os elétrons em movimento impedem a luz de chegar até nós. Isto porque a velocidade com que o elétron gira em torno do núcleo é tão alta que mesmo com sua minúscula massa impede a passagem da luz.

Sua velocidade é tal que pode ser comparada à própria velocidade da luz.

A velocidade dos elétrons é de tal magnitude que num determinado instante cada um deles pode estar ocupando qualquer espaço ao redor do núcleo. Ele tem apenas uma probabilidade de estar fisicamente num determinado lugar, num determinado instante. As fórmulas matemáticas da mecânica da física quântica não oferecem valores determinados, apenas probabilidades.

Compare com as hélices de um avião; as pás parecem estar em todo o entorno de seu eixo ao mesmo tempo, podemos olhar através delas porque sua velocidade é inferior a da luz. Mesmo assim, as pás parecem estar em todo lugar ao mesmo tempo. Com o elétron é parecido, mas em escala de velocidades imensamente superior.

É assim que se forma a matéria sólida de que são formados nossos corpos, o mausoléu de nossos pensamentos. A velocidade com que os elétrons giram ao redor de seus núcleos cria a matéria, lhe proporciona solidez. É como tudo no Universo físico é construído.

Esta é a assinatura do Grande Arquiteto do Universo dentro de nós mesmos.

Isto até contradiz Locke, mas não esqueçamos que nossa existência aqui é apenas resultado de ficção, do exercício de nossa mente criativa.

Mesmo assim, esta constatação nos leva a inferir ser este, de fato, o nosso local mais sagrado. Como é imenso o corpo físico de qualquer ser vivente! O homem em sua inteireza, considerando a carcaça, a mente, as emoções, sua espiritualidade e outros detalhes é um universo tremendamente complexo, semelhante ao grande Universo.

A este universo que existe dentro de cada ser vivente, devido exatamente a esta diversidade e complexidade, denominamos Macrocosmo apenas para simplificar nossas limitações de entendimento.

É assim, de forma espantosa, com quase nada de matéria, com quase absoluto espaço vazio que o Grande Arquiteto do Universo produziu toda a matéria sólida do Universo.

Milagre ou realidade?

Será que legitima a expressão do penso, logo existo, de Descartes?

Se tomarmos a realidade do ponto de vista em que nos encontramos agora, certamente deduziríamos que nada somos. Tudo o que existe é feito essencialmente de espaço vazio, somos feitos do nada, então nada deveríamos ser. Existimos apenas como que por milagre. Um maravilhoso feito do Incriado.

Heidegger argumentava que o ser se faz no tempo; e é o que constatamos em nossa experiência; o ser é o nada que o constitui.

Platão afirmava que o Universo em que vive o homem é ilusório, feito de sombras e aparências; em nossa experiência, quanto desta assertiva é verdadeiro?

O que acabamos de afirmar e virtualmente constatar, foi baseado na informação de que o elétron e o próton contêm massas, isto é, que sejam efetivamente feitos de matéria sólida, mas que o garante?

Existem considerações científicas atuais que dizem terem os átomos ora o comportamento de partícula e ora de fenômeno ondulatório, isto é, não possuírem massa e serem constituídas exclusivamente de campos de força, de campos eletromagnéticos, de energia.

Aí então a nossa pasma intelectualidade entra em pane!

Se os átomos não são nada mais que campos de força, então somos efetivamente feitos de puro espaço vazio, nada somos!

Simples fótons?

Campos magnéticos em interação e deslocando-se à velocidade da luz?

Ainda sem considerar a teoria das Supercordas que remetem até o instante do inicio da expansão do Universo, o inicio de toda a história que nossos cientistas sonhadores dão para o Universo e ao qual denominam big bang, já nos satisfazemos com o fato de constatar que existe um projeto racional e um objetivo válido para tomar parte nesta grande orquestra da vida, esta milagrosa massa de seres viventes. Porque olhando em nossa própria essência, sequer deveríamos existir! É um milagre! Os fatos apontam para uma realidade onde a vida tem uma insignificante possibilidade de se manifestar.

A Improbabilidade da Vida

Partindo da constatação que as fórmulas da mecânica quântica nos fornecem apenas probabilidades e nunca certezas qual seja a verdadeira constituição do átomo. Acrescente-se que as moléculas de que nossas carcaças são formadas constituem apenas um por cento de toda a massa do Universo, isto porque, 75% de toda matéria do Universo é formada por Hidrogênio, 24% é Hélio, e o restante 1% (um por cento) é constituído por todos os demais elementos da tabela periódica. Desde o lítio, passando pelo carbono até chegar ao urânio.

A química que dá origem à vida é uma insignificância quantitativa em relação ao gigantismo do Universo!

Daí nossa intelectualidade vir a se preocupar com a existência e a realidade nos faz singelos na imensidão deste Universo - especula-se que existam outros Universos. É deveras um milagre possuirmos consciência!

Percebe a maravilha desta descoberta dentro de nós mesmos?

Consegue observar o quanto somos infinitos na forma em que nos encontramos e o resto do Universo é finito? Em termos absolutos poderíamos até dizer que nem infinitos somos, mas inexistentes.

Conscientizou-se agora do quanto somos livres e iguais neste Universo criado pelo Grande Arquiteto do Universo?

É razão mais que suficiente para buscar o conhecimento para nos entendermos melhor uns com os outros.

Fazer estes tipos de viagens é o único caminho que dispomos para trilhar pelos caminhos que conduzem para a liberdade e perfeição; simplesmente porque nos conscientizamos que existe um criador, não é possível que tudo seja resultado de obras do acaso sem a presença de uma mente pensante por traz de tudo o que se manifesta na natureza.

Esta nossa realidade, esta nossa insignificância perante o milagre da existência material já é suficiente para nos levar a entender do porque o amor fraterno é o único caminho para a verdadeira igualdade.

Na essência somos todos relacionados e iguais. Somos imperfeitos em nossa materialidade, mas alcançamos a perfeição em nossa racionalidade, da mesma forma como disse Platão: o único círculo perfeito é a idéia de círculo que existe em nossa imaginação.

Abrangência do Mundo Interior

Estenda esta visão às outras dimensões que temos: espiritualidade, emotividade, pensamentos, e outros. Este conhecimento de nós mesmos não fica limitado ao que estamos percebendo neste instante, este crescimento exige a perfeição tanto do espírito como do coração.

Há necessidade de treinar nossas percepções tanto do visível como do invisível, e tudo é dedutível por nossa capacidade de abstração, de fantasia, até vir a comprovar-se pela experimentação científica. Assim como aconteceu com Pitágoras, que na tradição intelectual do mundo ocidental teve transformada a sua capacidade de mística matemática numa espécie de ponte entre a razão humana e a inteligência divina. De nossa parte, enquanto sonhamos, não temos provas materiais da imaginação ser realizável, ao menos enquanto estivermos restritos ao nosso cárcere material, ao nosso corpo físico. Tampouco criamos proposições que não possam ser questionadas, até contrariadas, pois algo assim, nas palavras de Isaiah Berlin, não contém informação.

Devemos procurar a justiça e a fraternidade, o amor fraterno, para obter a possibilidade de, mesmo imperfeitos em alguns aspectos, sermos levados à perfeição do intelecto e da espiritualidade pela força do pensamento.

E assim como efetuamos nossa caminhada até ficarmos sentados aqui nesta escuridão sem ter medo de nada, quando o tempo está em marcha, aonde chegamos devagar, um passo de cada vez. A Maçonaria nos ensina que o caminho da perfeição também não se dá aos saltos, senão com muita prudência e lentidão. Velocidade é coisa de elétron em sua órbita, nós devemos lentamente ir formando uma base educacional em busca da verdadeira liberdade que nos liberta do fanatismo, do ódio e outros vícios. Pois se viéssemos até aqui na superfície deste núcleo de átomo num salto, certamente desfaleceríamos. A escuridão nos enlouqueceria! Não entenderíamos que na escuridão de nosso mais recôndito ser, na falta da liberdade a que o elétron nos levou, nos sentiríamos presos, imobilizados, com medo de nos mexer, inclusive de pensar. E o medo desta prisão certamente nos induziria a adotar alguma postura fanática e alienante, quem sabe até, num ato desesperado, o suicídio.

Percebe o quanto a nossa capacidade de sonhar é infinita e como isto nos diferencia do homem-fera primitivo? A filosofia do Rito Escocês Antigo e Aceito está conectada ao conhecimento humano, desde sua pequenez diante do Universo, até o gigantismo de sua capacidade de sonhar e pensar. É pela capacidade racional inteligente que todo maçom deriva conhecimentos detalhados e genéricos para a sua própria sobrevivência física e intelectual. Uma coisa puxa a outra.

O sonhar leva a predispor o iniciado na busca contínua de instruções e conhecimentos. Isto o leva a efetuar saltos mentais e lhe impõem denodo quando se interna na caminhada dos mundos desconhecidos, reservados apenas aos que têm coragem de enfrentar as veredas do desconhecido. Mesmo que lá reine escuridão, a mente continuará a irradiar a luz do entendimento de verdades cada vez mais complexas e intrincadas.

O peregrino cego carrega junto de si a luz do entendimento ao buscar intensamente dentro de si mesmo o conhece-te a ti mesmo, de Sócrates. O homem pensador passa a aperfeiçoar-se.

Depois que se aperfeiçoou e descansou parte em nova jornada, em ciclos eternos de sonhos, racionalizações e sedimentações de novos conceitos.

Fica evidente que ao adentrarmos no mausoléu que somos, despertam idéias ocultas que até então não percebíamos. Encontramos alguns porquês da existência: De onde venho? Para onde vou? Algo que é possível descobrir com viagens ao interior de nós mesmos. Faz da passagem para o oriente eterno apenas mais uma etapa da vida; algo que alivia o constrangimento e medo da morte. Este é o conhecimento, a luz que o profano busca em nossos templos; é a travessia que o iniciado faz quando se desloca do ocidente para a luz do oriente. Ao nos libertarmos do medo da morte, rompem-se os grilhões da escravidão do mundo material e passa a brilhar a luz da sabedoria do Grande Arquiteto do Universo.

Templos Vivos

Todo maçom é considerado de fato um templo vivo.

Só a partir desta constatação o maçom passa a considerar-se criatura pura e sagrada. Certamente tudo faz para não conspurcar o ambiente sagrado de que é constituído seu templo interior, derivando que isto induza o desenvolvimento de conceitos morais e éticos cujo objetivo preservará a pureza do lugar sagrado de seu interior. Isto faz do mundo interior um lugar perenemente limpo e puro.

Desperta adicionalmente que apenas limpar o templo interior não é suficiente. A pureza moral e ética é insuficiente. Exige-se que o interior do templo, local da razão e dos sentimentos equilibrados, nutram o cérebro com estímulos que levem a buscar a perfeição. Daí ressalta-se a importância em velar na maioria das vezes do centro das emoções, o coração, de modo a mantê-lo subjugado à mente, pois é considerado esotericamente um mausoléu e tudo aponta para o coração como túmulo do maçom; ao menos enquanto não morrer o maçom que o contém.

O caminho para a liberdade e perfeição do maçom é dominar suas paixões com o objetivo de acabar com atitudes extremadas e fanáticas. E a vereda do espírito passa pela capacidade de sonhar, com grandes chances de converter a fera humana, apenas controlada pelas leis, em ser humilde diante da grandiosidade do que daqui divisamos.

Quando o tempo se desloca, em nosso interior reina escuridão enquanto não efetuarmos um salto para dentro de nós mesmos iluminados pela sabedoria do entendimento desta viagem. Este deslocamento é realizado em pequenas estações, para que o choque da descoberta desta escuridão não nos deixe cegos e com medo, assim como fazemos em nossa evolução pelos graus do Rito Escocês Antigo e Aceito.

O medo pode nos imobilizar e escravizar aos extremismos.

É necessária coragem para desbravar o caminho.

Agora que mostrei a minha senda, faça as tuas viagens a sós para dentro de você mesmo e descubra teus próprios caminhos. Só não se assuste com a escuridão do lugar, leve sempre junto a luz de tua capacidade intelectual para de lá sair em segurança. Ao homem maçom é dado caminhar só na busca de sua espiritualidade e liberdade, exatamente porque ninguém a pode fazer por outrem. É tarefa individual e intransferível.

E saiamos daqui, pois os trabalhos encerraram a meia-noite.


Bibliografia:

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda, Filosofando, Introdução à Filosofia, Editora Moderna, 1993.
ASLAN, Nicola, Instruções Para loja de Perfeição para o Grande 4 ao 14, Quarta Edição, Editora Maçônica A Trolha Ltda., 2003.
BOSQUILHA, Gláucia Eliane, Minimanual compacto de Química, Editora Rideel, 1999.
CAMINO, Rizzzardo da, os Graus Inefáveis, Loja de Perfeição, Volume 1, Primeira Edição da Editora Maçônica A Trolha Ltda., 1995.
Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa, versão 1.0, 2001.
GLEISER, Marcelo, Criação Imperfeita, ISBN 978-85-01-08977-7, 1ª edição, Editora Record, 366 páginas, São Paulo, 2010.
GUIMARÃES, João Francisco, Maçonaria, a Filosofia do Conhecimento, Primeira Edição, Madras Editora Ltda., 2003.
LOCKE, John, Ensaio Acerca do Entendimento Humano, Editora Nova Cultural Ltda., 2005
OLIVEIRA FILHO, Denizar Silveira de, Comentários aos grandes Inefáveis do Rito Escocês Antigo e Aceito, primeira Edição, Coleção Biblioteca do maçom, Editora Maçônica A Trolha Ltda., primeira Edição, 1997.
REALE, Giovanni e ANTISERI, Dario, História da Filosofia, Volume 1, Editora Paulus, 9ª edição, 2005.

Com a devida vénia ao autor,

Rui Bandeira