Mostrar mensagens com a etiqueta livre arbítrio. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta livre arbítrio. Mostrar todas as mensagens

15 fevereiro 2016

"Dilemas...maçónicos"


Ao longo da vida de um maçom, ele irá ser confrontado com vários tipos de dilemas e situações em que terá de refletir sobre as decisões a tomar e a responsabilizar-se pelo que decidir e optar.

Neste texto em concreto, irei abordar apenas alguns dos potenciais "dilemas" que serão possíveis de aparecerem ao longo do percurso de uma "vida maçónica".

Naturalmente que não irei responder a nenhuma das questões ou dilemas que irei apresentar porque a ideia é levar à reflexão sobre as mesmas e as ditas respostas apenas poderão ser dadas e concretizadas por quem por estes dilemas passar. E portanto, tal poderá diferenciar de pessoa para pessoa como de situação para situação.
E como tal ação "reflexão/execução" é do foro privado de cada um, considero apenas que tal deve ser feito da melhor forma que considerem que lhes serve e com a qual se sintam melhor, por forma a não se prejudicarem nem a prejudicar terceiros.

Deste modo passarei a citar potenciais dilemas que existem ou poderão vir a surgir durante a caminhada maçónica a que se proporá um maçom a fazer:

* Encontrando-se um maçom há tempo considerado suficiente para progredir (subir de Grau) e tal ainda não ter sucedido, por questões que lhe sejam alheias...

* Pertencer ao quadro de obreiros de uma Respeitável Loja e já não se identificar com a generalidade dos seus membros...

* Estar numa Obediência, mas sentir que deve prosseguir o seu caminho noutra que não a original...

* Auxiliar na fundação de uma nova Respeitável Loja e consequentemente não ter a certeza em qual ficar a pertencer em "exclusividade"...

* Se sentir desapoiado ou desintegrado da Respeitável Loja que o acolheu, mas pretender continuar a seguir uma vida na Maçonaria...

* Ter atingido o grau de Mestre e não saber decidir se deve optar pela continuação dos seus "estudos maçónicos" nos designados "Altos Graus" ou "Graus Filosóficos"...

* Ter entrado numa Ordem Maçónica e ter afinal chegado à conclusão que não se identifica com a sua substância, mas que se sente integrado e gosta de conviver com os seus "Irmãos"...

Estas questões que acima apresentei são, por certo, dilemas que um maçom poderá vir-se a debater, seja na sua totalidade ou em parte. E saber o que fazer é que será o busílis da questão.

Não será fácil decidir sobre tal, mas também não poderá tal ser feito de uma forma intempestiva dadas as consequências que por norma advêm de tais decisões.
Estas decisões ou escolhas deverão ser feitas após uma reflexão extensiva e ponderada, por forma a que nada nem ninguém saia beliscado com a decisão final a ser tomada.

-Não existe ação sem reação, já o afirmava Newton...-

 E gerir este tipo de situações, enquadrá-las como deverão ser feitas, sem melindres ou condicionantes, será difícil o fazer, apesar de não ser impossível tal. Respeito e Amor Fraterno serão essenciais para levar a bom porto qualquer decisão que venha a ser tomada e executada!

O melhor conselho que posso dar a quem passa ou puder vir a passar por alguma das situações que abordei é que um processo refletivo aprofundado e debatido com quem nos tiver mais próximo e também que nos possa elucidar sobre o tema é sempre bem-vindo, pois trará alguma "luz" à situação. 
Mas, importa ter em atenção que a decisão a ser tomada deve impreterivelmente ser confortável para quem a toma. Uma vez que é fundamental  que quem decide deve estar de bem consigo e com o seu "espelho", e não obstante, se sentir integrado e apoiado na decisão que vier a tomar, seja ela qual for. 
Isto é deveras importante, pois é normal sempre surgirem opiniões adversas que colidam com o interesse de quem tem de decidir o que fazer e/ou o caminho a tomar. Pois a vida é feita de ações/atitudes, tanto que as palavras são usualmente levadas pelo vento.

É preciso sentir, refletir e por fim, decidir. 

Se bem, se mal, apenas o tempo o poderá demonstrar, mas queira o Grande Arquiteto do Universo iluminar com a sua sapiência quem passa por estas situações, pois de facto não são fáceis por quem por elas passa ou tem de passar. O apoio dos seus Irmãos será crucial nesse processo refletivo e consequente ação.

Mais que tudo, o importante é se estar confortável (como já afirmei) com a decisão e que nos sintamos bem no local onde estivermos ou no sítio onde viermos a estar a pertencer. Nada será mais relevante que isso.

Por isso meus queridos e estimados Irmãos, se passarem por alguma destas situações que abordei, pensem, repensem, clarifiquem e somente depois façam!
O resto virá por si…


08 fevereiro 2016

Contradição fundamental


A Maçonaria regular só admite no seu seio crentes. Deixa, porém, ao critério de cada um a crença concreta que cada um professa, nada lhe importando a forma como cada um vive a sua crença. as obrigações que respeita (ou infringe...), a forma como se organiza (ou não) a estrutura que porventura enquadre a prática da religião professada, nem sequer a designação que cada um atribui à divindade que concebe e em que crê. Por isso, adotou uma forma de se referir à Divindade por cada um venerada, que é independente da designação utilizada em qualquer religião e que pretende seja reconhecida por cada crente como referindo-se à Divindade da crença que professa: Grande Arquiteto do Universo.

Assim, para a Maçonaria, um maçom pode perfeitamente, sem problemas ou reservas, ser católico, batista, anabatista, mórmon, pentecostal, evangélico, luterano, calvinista, testemunha de Jeová, muçulmano, judeu, hindu, ou o que quer que seja. A sua crença é do seu foro íntimo e é com ela que se junta aos demais maçons para que, em auxílio mútuo, cada um se aperfeiçoe pessoal, ética, moral e espiritualmente.

No sentido inverso, no entanto, as coisas não se processam de forma tão simples e clara. 

No âmbito da religião católica, é conhecido que repetidas vezes vários Papas emitiram documentos de condenação da Maçonaria, tendo mesmo, durante largo tempo, o Código de Direito Canónico punido com a excomunhão o católico que a ela aderisse. Hoje, não é já assim, mas o último documento proveniente da Cúria Romana continua a não ser particularmente simpático para a Maçonaria: 

Permanece portanto imutável o parecer negativo da Igreja a respeito das associações maçónicas, pois os seus princípios foram sempre considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e por isso permanece proibida a inscrição nelas.  Os fiéis que pertencem às associações maçónicas estão em estado de pecado grave e não podem aproximar-se da Sagrada Comunhão.

(excerto da Declaração sobre a Maçonaria de 26 de novembro de 1983 do então Prefeito da Congregação Para a Doutrina da Fé, Cardeal Ratzinger).

No âmbito da religião islâmica, também se conhecem posições de responsáveis nada lisonjeiras para a Maçonaria:

Dado que a Maçonaria se envolve em atividades perigosas e é um grande perigo, com objetivos perversos, o Sínodo Jurisdicional determina que a Maçonaria é uma organização perigosa e destrutiva. Todo o muçulmano, que se filiar nela, conhecendo a verdade dos seus objetivos, é um infiel ao Islão.

(excerto final do parecer de 15 de julho de 1978 do Colégio Islâmico Jurisdicional).

No campo das crenças cristãs resultantes da Reforma, também não é difícil encontrar posições contrárias à maçonaria:

A COMISSÃO FAZ A SEGUINTE PROPOSTA:
1) - QUE SEJA REAFIRMADA A POSIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO CONTRÁRIA A MAÇONARIA E OUTRAS SOCIEDADES SECRETAS;
(...)
4) - QUE A AIBRB FAÇA UM APELO COM BASE NO AMOR CRISTÃO, AOS CRENTES FILIADOS À MAÇONARIA, PARA QUE, POR AMOR A CRISTO E AO TRABALHO DE DEUS QUE NOS FOI CONFIADO, AFASTEM-SE DE TAL SOCIEDADE.

(excertos de proposta aprovada na 12.ª Assembleia da Associação das Igrejas Batistas Regulares do Brasil).

Não é de estranhar que existam posições antimaçónicas em vários setores ou hierarquias - normalmente os mais integristas, ortodoxos ou fundamentalistas - de várias confissões religiosas, se tivermos em atenção a contradição fundamental entre a Maçonaria e as religiões.

Cada religião, e particularmente nas religiões monoteístas, considera que o seu caminho, a sua doutrina, a observância dos seus preceitos é que conduz à Salvação. Portanto todos os que se posicionam no exterior do seu caminho, da sua doutrina, dos seus preceitos, estão destinados à Perdição.  

Já para a Maçonaria, a questão não se põe nestes termos. Cada um é livre de seguir o seu caminho, de professar a sua religião, de seguir os preceitos dela e todos são considerados iguais e aptos para serem bons e se tornarem melhores. A Maçonaria (o maçom) não concebe que o mesmo Criador, chame-se-Lhe Deus, Allah, Jeovah, Krishna, Manitu, ou o que se Lhe chamar, conceba, admita, queira, que os que O veneram por um nome sejam salvos e os que O conhecem por outro se percam, que os que seguem preceitos de uma Tradição religiosa recebam eterna recompensa e os que tiveram a desdita de nascer e viver num ambiente com diversa Tradição religiosa eternamente sejam punidos. 

Para a Maçonaria, o que importa é o comportamento, a postura ética, o reconhecimento do Transcendente e do Divino, não o cumprimento específico de normas, de práticas, de posturas, quantas vezes decorrentes de diversos ambientes, de diferentes culturas, de separações feitas pelos homens daquilo que o Criador fez igual.

Para a Maçonaria não há caminhos certos nem errados. O caminho de cada um é o certo para ele, se estiver de boa-fé e for perseverante nos seus propósitos.

A contradição fundamental entre a Maçonaria e as diferentes hierarquias religiosas está na Tolerância, que é inerente à Maçonaria e que os integristas, os ortodoxos e os fundamentalistas não aceitam. Tão simples como isto!

Rui Bandeira

28 dezembro 2015

Maçons, "livres-pensadores"...


Aqui há uns tempos em conversa com um amigo sobre determinado tema, disse-lhe eu isto: “eu apenas te mostro o mapa, caberá a ti escolheres o caminho”. E de facto esta é a realidade em que temos de viver. Ou seja, nós somos as nossas “escolhas”, nós somos as “decisões” que tomamos e as ações que decidimos praticar.

Por mais que uns nos digam para irmos para a “esquerda” , outros para a “direita” e alguns inclusive nos digam para seguir pelo “meio”, a decisão final sairá de nós próprios, da nossa vontade, independentemente das indicações e dos conselhos que recebamos e que possam nos auxiliar na decisão a tomar.

Se decidirmos agir de certa maneira, coincidindo ou não com o que a generalidade ou somente com o que alguns considerem sobre tal , foi a nossa mente que o decidiu. 
Assim, todos nós na nossa Vida somos  - e seremos sempre - responsáveis por aquilo que decidirmos, sejam ações ou palavras e até mesmo pelos mais simples pensamentos.
- Fomos nós que os criamos/produzimos, logo somos nós responsáveis por eles, por inerência-.
Por mais influências que recebamos externamente, é o nosso íntimo, o nosso “Soi”, que irá efetuar a escolha do que concretamente iremos fazer.

Será a mais correta?!
Será a mais eficaz?!
Será a mais proveitosa?!

O que sabemos é que é a nossa decisão e apenas isso. Foi o que optámos por decidir. E que tal decisão seja sempre tomada em consciência com os princípios que advoguemos e com os quais nos sintamos devidamente identificados.
-Sejamos honestos, íntegros e coerentes nas nossas decisões!-

Os maçons, “livres-pensadores” como orgulhosamente se assumem, devem ter bem a noção de tal. Não bastará assumir algo ou determinada coisa para depois não se praticar isso na realidade.
É sempre esperado que um maçom use o seu bom senso e os seus bons costumes para decidir, se possível sempre, da melhor forma possível face às situações que a vida lhe apresenta.
-Tem o dever de agir dessa forma!-

O que poderá acontecer, e muitas vezes é inevitável tal, é que nem sempre as decisões tomadas possam ser as melhores ou mais corretas, uma vez que o maçom, tal como outro ser humano qualquer, também erra, mas como maçom tem a obrigação de aprender com esse erro e evitá-lo no seu futuro.
E aqui assumo que os maçons também erram, infelizmente algumas vezes e talvez, digo eu, vezes demais. Mas como o maçom é alguém que busca evoluir espiritualmente, ele também estará susceptível de efetuar mudanças no seu comportamento; logo também as suas decisões serão influenciadas pelas mudanças/”transformações” que sofrer e as suas atitudes se revelarão melhor no seu comportamento e carácter. Tudo isto em prol do seu auto-aperfeiçoamento enquanto ser humano. 
Isso será o tal “polimento”, o tal “burilamento da pedra bruta” que na Maçonaria tanto se fala.

Os vícios ou erros comportamentais que possam ter existido na sua conduta no passado, deverão ficar aí mesmo, no passado. E “como de passado apenas vivem os museus” (como é usual se afirmar), no momento da Iniciação, no momento em que o recém neófito encontra a sua primeira centelha da Luz, nasce como uma nova pessoa, um “novo Homem”, e como tal terá acesso a “ferramentas sociais e espirituais” que poderá utilizar para melhor atingir o seu “nirvana”, por assim dizer. 

O que interessa por vezes não é o mapa mas o caminho que se seguiu, mesmo para o nosso auto-aperfeiçoamento, o que importa é que decidimos livremente as decisões que tomámos e que escolhemos sempre, mediante o que a vida nos vai apresentando e mediante as condições que temos, mas que foram  as melhores decisões que considerámos que podíamos e/ou devíamos tomar ou ter tomado. Isso sim, é o mais importante nisto tudo.

Este caminho que seguimos é feito sozinho (somos nós que o temos que fazer) mas não é solitário (pois outros o fazem também) e temos ter a consciência e a noção disto.
Se olharmos para o lado veremos alguém a viver as mesmas situações ou outras, com decisões tomadas semelhantes ou completamente diferentes daquelas que, se fosse connosco, tomaríamos. A vida é isto mesmo, cheia de imponderáveis e é essa uma das mais valias de viver, a cada passo dado, a cada momento, nunca sabemos o que se seguirá, apenas o podemos tentar prever e nada mais.

O que concluindo posso afirmar é que independentemente das decisões e escolhas que tomemos, somos nós que o deveremos fazer e não outrem. E por elas nos responsabilizarmos. São estas decisões que nos definem como pessoas!
A  grande diferença que temos em relação aos restantes seres vivos é a nossa “massa cinzenta” e que é devido a ela que pudemos livremente pensar.
É altura de a começarmos a valorizar mais e principalmente em a começar a usar de uma forma correta e eficiente.
E posto isto, porque não… pensar?!

16 dezembro 2009

Criar e fabricar


Jean Staune

A Loja Nacional de Investigação da Grande Loge Nationale Française tem o nome de Villard de Honnecourt, um arquiteto gaulês do século XIII. Esta Loja publica trimestralmente Les Cahiers Villard de Honnecourt. No decorrer da minha recente visita à Respeitável Loja Fraternidade Atlântica, o seu Venerável Mestre teve a amabilidade de me oferecer o último volume então publicado, o n.º 69, dedicado genericamente ao tema Aspetos do sagrado.

Logo nas páginas iniciais deste volume, encontrei e li uma interessante entrevista concedida por Jean Staune, fundador da Universidade Interdisciplinar de Paris e professor convidado em duas Universidades Pontificais em Roma e na Universidade de Shandong, na China. Considera-se um filósofo das ciências, trabalhando na encruzilhada entre a filosofia, a teologia, as ciências e a gestão. O seu último livro foi um sucesso editorial em França e tem um título significativo: A nossa existência tem um sentido?

Na entrevista, toca temas como a a necessidade humana da transcendência, em pleno século XXI, o papel de Deus no seu pensamento filosófico, o choque de civilizações, a busca iniciática, a Tradição.

Uma passagem da sua entrevista chamou-me particularmente a atenção e aqui a publico, em tradução livre minha:

A minha conceção de Deus foi muito influenciada por autores judeus, como Hans Jonas e o seu O Conceito de Deus depois de Auschwitz. Ele demonstra bem que a ideia de um Deus Omnipotente é contraditória com a ideia de uma verdadeira liberdade. Deus abdicou de uma parte da sua omnipotência, dando-nos uma verdadeira liberdade. Se Deus pudesse agir permanentemente para nos impedir de fazer esta ou aquela coisa, é claro que não seríamos livres. E se Ele não pode intervir, não é Omnipotente. Ele pode intervir, mas não pode suprimir a nossa liberdade, entre outras, a de fazer o mal.

Este conceito da abdicação parcial da Omnipotência em virtude da Criação não o tinha ainda encontrado e, na sua simplicidade, parece apto a responder ao paradoxo invocado a propósito dos atributos de Deus (Deus Omnipotente e Deus Omnisciente são conceitos incompatíveis entre si: se Deus, tudo sabe, sabe o que acontecerá até ao fim da eternidade e então não pode mudar o que vai acontecer; se pode mudar, não pode saber o que vai acontecer) e, sobretudo, ao entendimento de que só o ateísmo é compatível com o Livre-Arbítrio, pois a crença no Criador e na Criação implica que aquele, tendo Criado e podendo Mudar, a seu bel-prazer, tudo determina e, portanto, impede que haja verdadeiro Livre-Arbítrio.

Criar não é sinónimo de fabricar. Fabricam~se artefatos, que deverão ser como nós queremos, enquanto quisermos, como quisermos. O ato da criação implica algo mais profundo, mais dinâmico (muito mais interessante...): implica que o que criamos não fique sob o nosso absoluto controlo, que cresça e evolua por si, mesmo contra a nossa vontade.

Fabricam-se automóveis ou frigoríficos ou colheres. Tudo que se fabrica é estático. É e será o que foi fabricado, como foi fabricado, para o que foi fabricado. Nem mais, nem menos, nem diferente.

O que é criado tem potencial de evolução próprio e independente do seu criador. Uma criança como um cachorro, como uma planta, como uma obra de arte, que será vista, entendida e interpretada por mil maneiras diversas e imprevistas pelo seu criador (ou então não será uma obra de arte, antes qualquer coisa verdadeiramente não criada, apenas fabricada...).

O ato de criar implica então abdicar da possibilidade de determinar, do controlo, da decisão. Implica admitir que a criatura vai desenvolver-se, não como nós quereríamos, mas como ela própria se desenvolver, vai agir, não como gostaríamos, mas como ela própria decidir agir. Para o bem e para o mal.

Criar é, inevitavelmente, um ato de Liberdade e, mais do que isso, um hino à Liberdade. Porque usamos a nossa Liberdade para possibilitar que algo exista com Liberdade própria.

Deus só pode ter sido Omnipotente ANTES da Criação. Continuaria a ser Omnipotente se nada tivesse criado. Quando muito, se tivesse apenas... fabricado... Mas, quando optou por Criar, aceitou (quis aceitar, usou o seu poder de aceitar, sabendo qual a sequela de o fazer e querendo e aceitando essa sequela) a inevitável consequência de que tal ato implicava a abdicação da sua Omnipotência, em favor do Livre Arbítrio que criava e do que criava.

Este conceito não se me tinha ainda mostrado e descobri-o com esta passagem da entrevista de Jean Staune. Os ateus continuarão a dizer que nada prova sobre a existência de Deus. Eu continuarei a defender que a melhor prova da existência do Criador é a simples e mera observação do que está por cima da nossa cabeça ao ar livre numa noite de Verão sem nuvens... Aos que acenam com o Big Bang, continuarei eu a inquirir-lhes sobre o que e quem o despoletou... Esta ideia que encontrei nada resolve, sobre nada é definitiva. Mas, para mim, serviu para pensar um pouco, sob uma perspetiva em que não tinha ainda pensado.

Esta ideia que encontrei é apenas uma pedra que, por si só, nada constroi, nada acaba. Mas é uma pedra que encontrei e pontua o MEU caminho. Tanto me basta!

Rui Bandeira

17 junho 2009

Blogueirólico nada anónimo

("Blogueirólico" acabei de inventar. Significa "escrevinhador compusivo de textos de blogue". Se a palavra pegar, se se tornar neologismo, se porventura chegar a, ainda que de forma obscura, ter lugar no vocabulário da língua portuguesa, já sabem: reivindico a paternidade da sua invenção. Para que conste na Enciclopédia dos Conhecimentos Inúteis...)

Pois é! Estava eu, como há séculos o grande Camões escreveu sobre a bela Inês (de Castro, pois claro!), naquele engano de alma, ledo e cego, gozando o meu merecido repouso de quase três anos de muitos e variegados textos, parcimoniosamente matutando na melhor maneira de ir gerindo o institucional sítio da GLLP/GLRP, quando o José Ruah - amigo da onça! - matreiramente me atira, assim como quem não quer a coisa: Olha lá, o texto do aniversário do blogue fazes tu! Isso podes, não tem nada a ver com a Grande Loja...

E eu, pobre de mim, alma ingénua e pura (pelo menos, de vez em quando, sobretudo quando estou distraído...), nem me apercebi da armadilha, da ratoeira, da rede que subrepticiamente aquela raposa lançava sobre mim, para pilhar meu sossego! E, qual confiante criancinha de olho azul e louros caracóis, disse que sim!

Oh, destino cruel! Ai, que imprudência tamanha! Como pode um momento de desatenção mudar toda uma vida!

Um certo leitor deste blogue diria - que digo eu? Insistiria, teimaria, repetiria - que assim estava destinado, que tudo está determinado. Pensando nisso, intuí porque o determinismo tantos e tão abnegados defensores tem. No fundo, é um descanso, uma paz para a alma e a consciência, uma desculpa sempre à mão: a culpa não foi minha, o disparate não fui eu que o cometi, estava determinado, escrito nas estrelas e no Livro de Todos os Sucessos desde o Big até ao Bang, entendendo-se aquele como o estoiro inicial e este como o suspiro final de tudo o que existe, existiu e existirá...

Mas, ai de mim!, eu sempre tive a - vejo-o agora! - imprudência de acreditar firmemente no livre arbítrio - e na inerente responsabilidade que tal implica para cada um de nós. Não há desculpa possível para o disparate individual. Quem o faz, fê-lo. Por si. Por sua conta e risco. Por sua imprudência, pouco siso ou menos esperteza. Não há maneira de me poder consolar. Não estava nada escrito! O disparate fi-lo eu, por minha única e exclusiva culpa e imprevidência!

E, no entanto, bem poderia eu ter evitado tamanho trambolhão, tão aziago mau passo! Bem sabia eu que o alcoólico em recuperação, aquele que, anónimo ou não, conseguiu arranjar forças para se desintoxicar e consegue - quantas vezes há anos e anos - resistir ao chamamento da traiçoeira garrafa de bebida com álcool, não cede à tentação nem de um saudoso gole, muito menos de um desejado copo, porque sabe que, se ceder, o gole não será o único e o copo será apenas o primeiro.

Bem sabia eu - ex-fumador inveterado e permanentemente saudoso do inenarravelmente saboroso cachimbo - que quem consegue deixar de fumar, ainda que os anos tenham passado depois que se sobrepôs ao doentio hábito e conseguiu parar, se ceder à tentação de "dar só uma passa" é meio caminho andado para, a breve trecho, voltar a gastar mais em tabaco do que em combustível para o automóvel, enegrecer os pulmões, estreitar as artérias e apressar o conhecimento do que está para além da Derradeira Viagem...

Bem sabia eu que o vício, traiçoeiro, espreita, manso e escondido, a oportunidade para se reapossar de nossa vontade!

Apesar disso, apesar de tudo isso saber - oh! suprema imprudência! - disse que sim! Pior! Cumpri! Escrevi mesmo o texto do terceiro aniversário do blogue. Todos são testemunhas! Mas, se alguém duvida da minha desgraça, cavada com as minhas próprias mãos, torneada com o meu próprio teclado, revelada pelo meu próprio monitor, confira aqui a prova do meu deslize, da minha imprevidência!

Pois. Cedi. Não pensei. E agora, pobre e desgraçado blogueirólico nada anónimo, para aqui estou, tremendo, com os neurónios excitados, ansiando por mais e mais textos, com os dedos frementes de excitação alongando-se para o teclado, com cãibras nos olhos de tanto os virar para o monitor e de lá os afastar! Toda a minha abstinência, todo o esforço que me convenci ter tido sucesso, crente de me ter conseguido libertar da compulsão da escrita, foi então em vão?

Cedo? Desisto? Jogo tudo no vermelho, esperando que não saia preto?

Ah! A tentação é grande! A volúpia da palavra, o veludo da frase, assolam-me todos os sentidos!

Mas eu sou maçon! E que faz o maçon? Pratica a virtude e cava masmorras aos vícios! Há que resistir ao vício! Lutar...

Mas eu não sou perfeito! Por isso sou maçon. Porque reconhecço que necessito de me aperfeiçoar. E o ótimo é inimigo do bom. Lutar contra o vício, lutarei. Mas só na medida em que seja vício. Afinal de contas, o segredo está na moderação. Não me deixar cair em excessos. Não escrever nada é fugir do vício. Escrever com moderação é combatê-lo. E os maçons combatem os vícios...

Por isso, eu blogueirólico nada anónimo me confesso: decidi combater o meu vício e... só para mostrar que não tenho medo dele... escrever este texto!

(E quem não percebeu que, como sempre, o tema da escrita é a Maçonaria, faça o favor de ler outra vez, para perceber! Há muitas maneiras de escrever sobre maçonaria. Também levezinhas. Também brincando. Porque, ao contrário do que se diz por aí, a melhor maneira de lidar com as coisas sérias é conseguir brincar com elas. Porque, às vezes, aprende-se mais a brincar do que em muitas horas de aturado estudo. Perguntem a qualquer criança!)

O blogueirólico,

Rui Bandeira